Falta investimento em prevenção para evitar tragédias como a de Los Angeles, dizem especialistas

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JULIA CHAIB
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS)

Faltam investimentos em prevenção para evitar incêndios descontrolados, como os que atingem Los Angeles, afirmam especialistas em crise climática. As queimadas causaram ao menos cinco mortes e deixaram mais de 100 mil pessoas desabrigadas.

Parte da cobrança pela tragédia tem sido feita à prefeita da cidade, Karen Bass, que no ano passado decidiu diminuir a verba para investimentos no setor.

Segundo dados publicados por Kenneth Mejia, chefe do orçamento de Los Angeles, os recursos destinados ao Corpo de Bombeiros em 2025 foram reduzidos em cerca de US$ 17,5 milhões.

Neste ano fiscal, a verba passou de US$ 837,2 milhões para R$ 819,6 milhões. Segundo reportagem da NBC Los Angeles, a chefe do Corpo de Bombeiros, Kristin Crowley, reclamou da situação no mês passado.

“A redução limitou severamente a capacidade do departamento de se preparar, treinar e responder a emergências em grande escala, incluindo incêndios florestais”, escreveu.

Bass, porém, defendeu-se e afirmou que o corte não teve impactos. Nesta quinta (9), o presidente Joe Biden declarou situação de grande desastre para a Califórnia e anunciou que o governo federal vai enviar aviões-tanque, helicópteros e recursos financeiros para os afetados.

A prefeita também é cobrada por moradores e tem sido questionada em entrevistas sobre sua ausência na cidade no início dos incêndios.

Quando os primeiros alertas sobre as chamas foram disparados, na semana passada, a prefeita estava em Gana como parte de uma delegação enviada por Biden para a posse do novo presidente. Ela só retornou aos Estados Unidos na quarta-feira (8), no segundo dia de queimadas fora de controle.

A repórteres Bass afirmou que, embora estivesse longe, estava monitorando a situação a todo momento.

Chris Field, professor de Stanford que foca a redução de riscos ambientais, diz que as queimadas na Califórnia são parte de um “padrão catastrófico” observado nos últimos dez anos. Para ele, as equipes são bem preparadas, mas é preciso mais investimento em prevenção diante de tragédias naturais cada vez maiores.

O grande problema, avalia, é que as equipes e infraestrutura são escassas para lidar com a situação.

“Aeronaves não são suficientes. Equipes bem treinadas não são suficientes. Você só precisa de um investimento muito maior em detecção e supressão de incêndios”, diz Field.

“Na Califórnia, não fizemos um trabalho tão bom quanto deveríamos em garantir que áreas propensas a incêndios sejam geridas para controlar o risco. As demandas sobre a cidade e a seriedade dos eventos meio que sobrecarregaram os melhores esforços de todos para se antecipar a eles. E essa é a descrição clássica de não estar bem preparado o suficiente.”

O professor diz que é difícil para políticos investirem em medidas de prevenção devido às dificuldades dessas iniciativas de serem percebidas pela população, como ocorre em vários países.

Field, que também foi um dos dirigentes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, que forneceu a base científica para o Acordo Climático de Paris, afirma que as mudanças climáticas contribuem para alterações no padrão de emergências naturais. Por isso, avalia, é preciso que as autoridades entendam que o risco de desastres é maior e que eles podem causar estragos mais intensos.

“Nunca devemos assumir que as abordagens inteligentes de décadas passadas ainda são relevantes hoje.”

Patrick Gonzalez, professor de Berkeley, com doutorado em mudanças climáticas, afirma que as florestas da Califórnia têm um regime natural de incêndio e que, a cada 50 a 100 anos, as queimadas são de alta severidade. Ele pondera, no entanto, que a chamada ação de ignição, que dá início ao fogo, por parte das pessoas, têm ampliado esse risco.

“Medidas de prevenção de incêndios reduzem efetivamente os riscos e custam menos do que o combate ao fogo após o fato”, diz.

Além disso, ele cita medidas anteriores consideradas por ele como equivocadas. “Políticas ultrapassadas suprimiram todos os incêndios, inclusive os naturais, permitindo que madeira morta e outros combustíveis se acumulassem, aumentando o risco de incêndios.”

Gonzalez aponta outro problema, que é a permissão concedida por Los Angeles para que as pessoas morem em áreas de riscos.

“As agências governamentais dos EUA e da Califórnia implementam programas para incentivar os proprietários a limpar a vegetação ao redor dos edifícios. O risco de incêndio subjacente deriva dos condados que permitem a construção de casas e outros edifícios em áreas propensas a incêndios.”

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