Senadores preveem Alcolumbre ‘calibrado’, com trato direto com Lula e agrados para oposição

davi alcolumbre

THAÍSA OLIVEIRA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Eleito com o terceiro maior placar da história, o novo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), prometeu pacificação e construção de pontes, mas deixou claro aos colegas parlamentares que, entre o PT de Lula e o PL de Jair Bolsonaro, escolherá defender os interesses do Congresso.
Integrantes do governo Lula não escondem uma certa desconfiança. Alcolumbre volta à presidência do

Senado com o apoio de Bolsonaro e já de olho na reeleição ao cargo, em 2027. Para reter o apoio interno, buscará honrar a promessa de que a oposição terá o que quer: espaço para tentar desgastar o governo em um ano decisivo para a próxima disputa presidencial.

Um senador próximo a Alcolumbre acrescenta que já está claro que ele pretende tratar com Lula sem intermediários. Por isso, afirma, o sucesso do governo no Congresso vai depender diretamente da interlocução do petista com o novo presidente do Senado.

Alcolumbre tenta diminuir as suspeitas. Em uma das conversas que teve com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), argumentou que, em seu primeiro mandato como presidente, não atrapalhou Bolsonaro porque não cabia a ele dificultar o trabalho do ganhador da eleição. Agora, prosseguiu, quem ganhou foi Lula.

O recado foi tornado público após a vitória, no sábado (1º), de forma enfática. “Nenhum senador, nenhuma senadora, tem autoridade de atrapalhar a agenda do governo. O governo terá sua agenda totalmente respeitada”, disse.

O governo viu o aceno com bons olhos, mas sabe que o senador pelo Amapá não tem pudores de dizer o que quer –e, via de regra, tem desejos pouco modestos. Alcolumbre é padrinho da indicação de dois ministros e de uma lista de cargos de segundo, terceiro e quarto escalões.

O senador angariou poder entre os colegas não só pelo perfil de síndico, resolvendo problemas de toda ordem, mas também pela distribuição de uma fatia bilionária do Orçamento público, da qual não quer abrir mão.

Como presidente do Senado de 2019 a 2021, Alcolumbre ajudou a estabelecer, com o aval de Bolsonaro, um mecanismo de distribuição volumosa de emendas parlamentares para os redutos de deputados e senadores. Hoje, o uso da ferramenta é motivo de uma batalha entre Congresso e STF (Supremo Tribunal Federal).

A defesa das emendas ficou nítida nas primeiras declarações de Alcolumbre após a vitória. Uma pessoa próxima ao novo presidente vai além: afirma que, enquanto o Congresso não tiver garantias de que manterá poder sobre o dinheiro, o governo não deve esperar nada de graça do Senado.

Nem mesmo a Polícia Federal parece fazer o senador mudar de ideia. O partido de Alcolumbre, União Brasil, entrou na mira de investigações em dezembro. O senador não é citado, mas reportagem do UOL mostrou que a chefe de gabinete dele ajudava a destravar a burocracia das emendas para um grupo de empresários preso.

Além do controle sobre o Orçamento, fatores eleitorais devem ditar o ritmo da relação. Um aliado de Lula diz, sob reserva, que o Planalto sabe que o amapaense não deve perder de vista a popularidade do presidente. No momento de dificuldade atual, a avaliação é que Alcolumbre não buscará o rompimento, mas não deixará de jogar confete para a oposição.

O estilo de Alcolumbre ficou marcado por sua gestão como presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), de 2021 a 2024. O senador estabeleceu um mantra: vota-se tudo, e quem tem voto leva. Foi assim que a comissão aprovou propostas controversas, como a castração química para estupradores e a legalização de cassinos.

A máxima, por outro lado, não o impediu de explorar o poder de presidente da comissão mais importante do Senado. Em 2021, Alcolumbre desafiou até mesmo um futuro ministro do STF ao deixar o indicado de Bolsonaro, André Mendonça, esperando quatro meses para ser sabatinado.

Na campanha para volta à presidência do Senado, Alcolumbre recorreu ao mantra outra vez. Com Bolsonaro, deixou claro que não vai se contrapor à votação de nada. Com Lula, disse que não tinha nenhum compromisso com a anistia aos golpistas do 8 de janeiro.

Integrantes da oposição admitem, reservadamente, que não veem condições para aprovar a anistia nos próximos dois anos e muito menos o impeachment de ministros do STF. Primeiro, porque não há votos –cenário que pode mudar apenas com a renovação de dois terços do Senado no ano que vem.

Segundo, porque Alcolumbre não quer –ao menos não neste mandato. O governo também conta com a amizade entre Alcolumbre e o ministro do STF Alexandre de Moraes para frear a anistia aos golpistas e ao próprio Bolsonaro, que está inelegível.

A Folha conversou com 14 senadores sobre o que esperar da presidência de Alcolumbre. Ouviu da maioria que o amapaense volta ao cargo mais calibrado, experimentado e equilibrado.

Também contribui para a avaliação de que o segundo mandato será moderado o fato de que as duas principais comissões, a CCJ e a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), estarão nas mãos de dois dos senadores experientes e próximos do Planalto, Otto Alencar (PSD-BA) e Renan Calheiros (MDB-AL).

A oposição promete fazer barulho com a perspectiva de presidir a Comissão de Segurança Pública com Flávio Bolsonaro (PL-RJ) –e marcar posição contra Lula em um dos assuntos considerados mais sensíveis pela população.

Sob o signo do equilíbrio, Alcolumbre também prometeu resolver um dos principais pontos de incômodo do Senado: a perda de poderes para a Câmara. O senador disse que vai conversar com Hugo Motta (Republicanos-PB) sobre o rito de tramitação das medidas provisórias, suspenso por vontade de Arthur Lira (PP-AL), e defender o Senado.

Além de assumidamente corporativista, o senador agrada aos colegas pelo estilo. É mais informal, direto e expansivo que o antecessor Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Menos disciplinado, mas cumpridor de acordos. Até amigos brincam que o presidente do Congresso parece um vereador –o que não é dito como crítica.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.