Gusttavo Lima à mesa com Churchill

Elizeth Cardoso (1920-1990) morreu em maio de 1990, 8 meses após Gusttavo Lima nascer. Tinham em comum somente a nacionalidade e o ofício até o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) rir a bandeiras despregadas com uma piadinha segundo a qual o cantor estaria preparado para ser presidente da República por preencher o requisito de “beber muito”. Aí, entrou em cena a Divina, título honorífico pregado em sua voz como uma bandeira. Em 1973, ela lançou “Eu bebo sim”, composta por João do Violão e Luiz Antônio. Gusttavo Lima bebe, sim. E daí?

A letra mostra que o comentário acerca do sertanejo era para rir, sim, mas em comemoração, pois o hábito da bebida faz o monge, o empresário, o lavrador, o gestor público. Sobe o som da divina Elizeth:

“Tem gente que detesta o pileque
Diz que é coisa de moleque
Cafajeste ou coisa assim
Mas essa gente quando está com a cuca cheia
Vira chave de cadeia
Esvazia o botequim”

O gosto pelo álcool nunca prejudicou os governantes. E alguns dos melhores da história da humanidade enchiam a cara com muito orgulho, com muito amor. Houve fiascos administrativos de determinados cachaceiros, talvez por serem pouco determinados, não por serem cachaceiros. A chave de cadeia está mais perto dos palácios que dos botecos.

Os 2 maiores chefes que o Executivo federal teve, um na República, Juscelino Kubitschek (1902-1976), outro no Império, d. Pedro 2º (1825-1891), adoravam cachaça. O intelectual d. Pedro 2º divertia o paladar com a atração tupiniquim acompanhada de outra unanimidade da nobreza, a sopa de galinha, que, igual à caipirinha no sucesso de Elizeth, “não faz mal a ninguém”.

O incêndio de 2018 no Museu Nacional consumiu os cardápios da época, mas o cheiro da branquinha resiste na memória afetiva. JK amava aguardente de cana produzida em Minas Gerais. Se alguém pedisse uma Providência imediata, pronto!, ali mesmo estava a garrafa batizada com o trocadilho. Se Gusttavo Lima tiver a curiosidade cerebral de um e a animação realizadora do outro, seu mandato será também inesquecível.

Nesta mesa está faltando ele, Lula, atual ocupante do cargo. Bebe, sim, e está vivendo. Com ele já foram feitas todas as pilhérias possíveis, das anedotas de antigamente aos memes de agora. Nunca perdeu nem meio voto por esse motivo. Beirando os 80 anos de incessantes biritas, o petista possivelmente diminuiu o levantamento de copo, ainda que sem querer. Aí, não há Carreta Furacão que melhore o destino de Sidônio Palmeira, novo ministro da propaganda, porque o Lula tonto governava melhor que o Lula apaixonado. Pode checar nos documentos: não havia sequer um embriagado durante as atividades geradoras do Mensalão ou do Petrolão. Os sóbrios, nesses casos, é que deram prejuízo ao Brasil.

Além de Lula, outro personagem presente nesta roda é Winston Churchill (1874-1965). O líder mundial que vergou Hitler admitiu ter tirado mais proveito do álcool que o contrário. Para Gusttavo Lima superar Churchill na saborosa competição, seria obrigado a transformar o fígado num microalambique. Havia pontualidade britânica no número 10 de Downing Street: sorvia ainda na cama os primeiros goles de Red Label. E essa maratona etílica não o impediu de livrar a Europa dos nazistas. Como o artista se autodeclara embaixador, quem sabe Churchill o nomeasse para o corpo diplomático…

De mãe americana, Churchill herdou a propensão para os goles extras. Os pais fundadores dos Estados Unidos eram chegados num drinque. Corrigindo, em vários. Ao mesmo tempo. George Washington (1732-1799), emérito cervejeiro, fez as honras da Casa Branca. O lado de dentro do balcão da residência oficial ficou vazio, mas demorou pouco. Thomas Jefferson (1743-1826) foi à Europa e atravessou o Atlântico de volta com 20.000 exemplares de preciosidades, os mais legítimos vinhos franceses. Gusttavo Lima, mesmo que morasse num barril, não conseguiria tomar tanto.

Assim segue a saga dos filhos dos pais fundadores e sobrinhos do Tio Sam. Ah, teve a Lei Seca. Sim, porém contra a vontade do presidente Woodrow Wilson (1856-1924), que vetou a inutilidade, reavivada pelo Capitólio.

WW, esperto e de bom gosto, manteve uma gôndola particular na White House, descrita pelo vozeirão de Elizeth:

‘Tem gente que já está com o pé na cova
Não bebeu e isto prova
Que a bebida não faz mal
Uma pro santo, bota o choro, a saideira
Desce toda a prateleira
Diz que a vida tá legal”.

Os graúdos dispõem de uma vida legal –e não só do ponto de vista jurídico– qualquer que seja a acusação do etilômetro. Sim, Abraham Lincoln (1809-1865) era abstêmio. Sua biografia lhe permite ter esses defeitinhos prosaicos. Todavia, sim, Franklin Roosevelt (1882-1945) eliminou a Lei Seca e, com ou sem ela, bebia bem.

Caso se eleja em 2026, Gusttavo Lima vai chegar ao posto máximo na mesma faixa etária de John Kennedy (1917-1963), outro que soube apreciar o que o planeta apresentava de melhor. O amor de Marilyn Monroe, inclusive. Que, aliás, curtia homens e champanhe notáveis.

Bota o choro e a saideira.

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