Governo cogita decreto para segurar despesas diante de atraso no Orçamento de 2025

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IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cogita editar um decreto para segurar, de forma provisória, a execução de despesas não obrigatórias diante do atraso na votação do Orçamento de 2025.

Essa seria uma medida preventiva para garantir à equipe econômica maior margem de manobra, caso haja necessidade de congelar recursos no futuro para compensar eventuais aumentos de outros gastos ou frustrações de receitas.

A discussão foi confirmada à reportagem por quatro técnicos do governo, mas ainda não há decisão fechada sobre o tema.

O governo costuma fazer um diagnóstico periódico da execução do Orçamento por meio de um relatório de avaliação bimestral. Nele, a equipe econômica indica a necessidade ou não de agir para cumprir o limite de gastos ou alcançar a meta de resultado primário (diferença entre receitas e despesas, descontado o serviço da dívida pública).

Em condições normais, o primeiro relatório seria divulgado em 22 de março. No entanto, sem ter o Orçamento aprovado, o governo não tem base legal para efetuar bloqueios (em caso de alta nas despesas obrigatórias) ou contingenciamentos (em caso de frustração de receitas). Por isso, é possível que nem haja divulgação do relatório.

O instrumento que a equipe econômica tem à sua disposição neste momento é o decreto de execução provisória. Nele, o governo pode estabelecer um controle mais rigoroso, com um limite menor para os ministérios executarem neste início de ano. A contenção só vale para despesas discricionárias (como custeio e investimentos) e não afeta gastos obrigatórios, como benefícios previdenciários ou salários do funcionalismo.

Uma portaria de 2022 do Tesouro Nacional já prevê que, enquanto não sai o decreto habitual de programação orçamentária (após aprovação da lei), as liberações de recursos para despesas discricionárias já ficam sujeitas a um limite mensal de 1/18 da dotação original. No entanto, isso vale apenas para o desembolso de recursos financeiros, ou seja, pagamentos efetivos uma espécie de controle na boca do caixa.

Essa trava não vale para o empenho, que é a primeira fase do gasto, quando o governo faz a reserva de recursos para quitar o débito no futuro, após a entrega do produto ou serviço. É essa etapa que o governo agora estuda controlar por meio do decreto de execução provisória. Neste momento, o limite está mais frouxo, equivalente a 1/12 da dotação original.

Segundo três técnicos ouvidos pela reportagem, a execução efetiva dos ministérios já está abaixo desse limite, o que é comum no início do ano. No entanto, como a votação do Orçamento vai ocorrer só depois do Carnaval, pode ser prudente editar o decreto para evitar que os ministérios pisem no acelerador e dificultem a tarefa de contenção no futuro.

A depender da data de aprovação do Orçamento, o governo pode aguardar a próxima data habitual de revisão bimestral de receitas e despesas (22 de maio) para fazer futuros ajustes, ou antecipar essa análise por meio de um relatório extemporâneo, que pode ser editado no momento que o governo julgar conveniente.

A necessidade de bloqueio devido à alta de despesas obrigatórias é um cenário considerado provável pelos técnicos da área econômica.

O Executivo precisa acomodar, já na largada, uma expansão de R$ 27,65 bilhões em despesas obrigatórias, como mostrou a Folha. A pressão se deve à evolução dos benefícios previdenciários, à aceleração da inflação e ao reajuste maior que o inicialmente previsto no salário mínimo.

Esse primeiro ajuste deve ser feito na votação do Orçamento pelo Congresso Nacional, amortecido pelos ganhos obtidos com as medidas de contenção de gastos aprovadas no fim do ano passado.

No entanto, o governo já identificou, no início de 2025, uma execução financeira mais acelerada em programas como o BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.

A julgar pelo ritmo detectado, segundo um dos técnicos, será necessário rever o gasto com o programa para além dos R$ 118,1 bilhões já orçados o que exigirá bloqueio em outras áreas.

Por isso, o governo tem como uma de suas prioridades atingir as condições necessárias para usufruir do espaço adicional de R$ 12,44 bilhões que a lei do arcabouço fiscal permite incorporar ao limite de 2025 devido à aceleração da inflação na reta final do ano passado.

O uso do espaço extra, porém, depende de receitas suficientes para cumprir a meta fiscal, que é de déficit zero, mas permite um saldo negativo de até R$ 30,97 bilhões. Por isso, técnicos e integrantes da equipe econômica admitem nos bastidores que será necessário discutir medidas de arrecadação, embora ainda não haja definição sobre o tema.

Esse será um desafio nada trivial, dado que o Legislativo não aprovou o projeto que previa arrecadar mais R$ 21 bilhões neste ano com a maior tributação sobre empresas, e os parlamentares têm dados sinais de que a agenda de receitas sofreu um esgotamento após dois anos.

Ainda assim, o governo considera o crédito extra essencial para garantir uma gordura maior caso seja necessário, depois, segurar as rédeas da despesa para cumprir as regras fiscais. Assim, a equipe econômica poderia exercer as travas sem sacrificar tanto as ações dos ministérios.


O IMPASSE DO ORÇAMENTO DE 2025
O Congresso Nacional ainda não aprovou a LOA (Lei Orçamentária Anual) de 2025. Nesses casos, a legislação garante o pagamento de gastos obrigatórios, como benefícios e salários do funcionalismo, e estabelece um ritmo proporcional para a execução de despesas discricionárias, como custeio e investimentos.


O que o governo discute fazer?

A área econômica cogita editar um decreto de execução provisória para limitar a execução dos gastos não obrigatórios a um ritmo ainda mais lento do que o atual. Esse controle ajudaria a formar uma espécie de reserva no Orçamento, que futuramente facilitaria a tarefa de efetuar bloqueios ou contingenciamento de recursos.


Por que a medida pode ser necessária?

Trata-se de uma ação preventiva. Se o governo não controla agora a execução de gastos, futuramente haverá uma base menor de despesas sujeitas à contenção, o que pode penalizar atividades que, por alguma razão, tenham tido um ritmo mais lento de execução, em benefício de ministérios que tenham pisado no acelerador no início do ano.


O governo não pode fazer desde já o bloqueio ou contingenciamento?
Não há base legal para isso, pois a LOA ainda não foi aprovada. O instrumento que o governo tem à sua disposição neste momento é o decreto de execução provisória.
Qual é a diferença entre bloqueio e contingenciamento?
O novo arcabouço fiscal determina que o governo observe duas regras: um limite de gastos e uma meta de resultado primário (verificada a partir da diferença entre receitas e despesas, descontado o serviço da dívida pública).
Ao longo do ano, conforme mudam as projeções para atividade econômica, inflação ou das próprias necessidades dos ministérios para honrar despesas obrigatórias, o governo pode precisar fazer ajustes para garantir o cumprimento das duas regras.
Se o cenário é de aumento das despesas obrigatórias, é necessário fazer um bloqueio. Se as estimativas apontam uma perda de arrecadação, o instrumento adequado é o contingenciamento.

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