Falta de pulso e compromisso fiscal de Lula 3 pode levar a crescimento “voo de galinha”, apontam economistas goianos

Desde que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu a presidência da República pela terceira vez, o mercado se mostra inquieto, já que muitas das declarações do petista iam (e ainda vão) na contramão do ordenamento esperado pelas instituições financeiras nacionais e internacionais. Ataques às taxas de juros praticadas pelo Banco Central e críticas ao teto de gastos, por exemplo, inflam os ânimos. 

Hoje, diante de um cenário de alta nos alimentos, nos combustíveis e nas taxas de juro, a popularidade do presidente cai, junto com o poder de compra do cidadão médio. Apesar disso, sinais controversos povoam a cena: recorde de emprego e PIB crescendo acima do esperado. O Jornal Opção conversou com economistas de diferentes setores da sociedade para entender o que se trata de uma crise econômica, de fato, e o que é respingo da popularidade em queda de Lula. 

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Descompasso 

Para Cristiane Schmidt, ex-secretária da Fazenda de Goiás e vice-presidente da Associação Brasileira de Direito e Economia, “não se tem em nenhum horizonte a questão de recessão”, entretanto a falta de compromisso fiscal do governo se coloca como um problema.  

Um orçamento cada vez mais comprometido e uma dívida PIB crescente são reflexos desse “descasamento entre política fiscal e monetária”. Para Schmidt, o único acerto vindo da atual gestão do Governo Federal foi a condução da Reforma Tributária.  “A única coisa que ele [Lula] fez, e fez bem”, afirmou. Os efeitos dessas mudanças, entretanto, só deverão ser sentidos de forma mais concreta após 2030, aponta a especialista. 

Para Schmidt, um maior compromisso com os gastos do governo se faz essencial para controle da inflação l Foto: Divulgação/Economia

Schmidt coloca o descompasso entre a atuação do Banco Central, que busca controlar a inflação através da alta na taxa de juros, e do Governo Federal, que não se compromete com controle de gastos, como principal descalabro dessa gestão. “O fato do ministro da Fazenda ter relativizado a inflação entre 4 e 5%, enquanto a meta é de 3%, ficou muito ruim. A mensagem é de leniência com relação à inflação”, sintetizou. 

As medidas sociais propostas pelo governo com um orçamento consideravelmente engessado pesam ainda mais nesse cenário. A verba que possibilita adoção de medidas como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil deve pesar ainda mais o orçamento e reforçar a dívida do governo. “Responsabilidade social só é possível de fato quando você tem responsabilidade fiscal”, concluiu. 

A inflação

O economista André Luis Braga reforça o que é dito por seus colegas: “O grande mal da economia chama-se inflação descontrolada”. A recente alta nos preços de produtos que afetam o cotidiano dos brasileiros se dá devido a uma soma de fatores, afirma o especialista, mas uma inflação “desancorada” e a alta no dólar são alguns pontos centrais para explicar o atual cenário. 

Para André, a postura do Governo Federal com relação aos seus gastos é fator decisivo nessa dinâmica. “O governo tem que demonstrar mais segurança, segurança jurídica, trazer mais segurança fiscal para o país para que os investidores tenham mais confiança”, resumiu. Para o especialista, a falta de compromisso do governo com seus gastos gera desconfiança do mercado, afasta investidores e eleva a inflação, o que repercute em toda a cadeia produtiva. 

André afirma que a explicação para a alta atual dos preços de alimentos e combustíveis, por exemplo, é multifatorial l Foto: Arquivo pessoal

Ainda na tentativa de explicar a alta nos preços, ele traz a dinâmica com o mercado externo. André reforça que o dólar possui muita influência em nossa cadeia produtiva, seja de forma direta ou indireta, e nossa economia se baseia muito na exportação, o que deixa o mercado interno mais vulnerável às oscilações internacionais. “Com o real cada vez mais desvalorizando, nós temos um cenário que para a importação de produtos fica muito desfavorável”, resumiu. 

Apesar dos pesares, André afirma que “de fato, neste momento, ainda não” vivemos uma crise econômica propriamente dita. Para alcançar esse ponto, é preciso uma inflação e taxa de juros acima do projetado pelas instituições financeiras, PIB retraindo, desemprego em alta entre outros fatores conjugados. 

A fim de contornar a atual situação, o que pode ser feito pelo Poder Público é uma “revisão de gastos” e promoção de “reformas que seriam extremamente importantes para a sociedade em longo prazo, como uma reforma administrativa”, sintetizou. Além disso, é fundamental garantir a autonomia do Banco Central, ponto positivo da atuação do atual governo, segundo André.

Compromisso fiscal e social 

O economista Danilo Orsida explica que, atualmente, “nós temos um crescimento econômico de números até mesmo expressivos”, reforçando a posição do Brasil entre as maiores economias do planeta. A participação no BRICS, para o especialista, é um sinal claro de que a tendência brasileira nos próximos 50 anos é de consolidação de uma economia forte. Entretanto, “o grande desafio, não só para o Brasil, mas para as economias em desenvolvimento, é que esse crescimento represente melhor qualidade de vida para a população”. 

Para ele, os mecanismos de intervenção na economia que o Poder Público pode lançar mão, devem ser guiados pela busca de um “equilíbrio de renda”, garantindo aumento no poder compra e na renda da população geral. Orsida coloca três ferramentas principais à disposição dos governos para alcançar esses fins, sendo elas a política fiscal (ligada a temas como Reforma Tributária), a política cambial (que traz as dinâmicas de valorização e desvalorização da moeda) e a política chamada política monetária (associada às taxas de juros).

Para Orsida, os indicadores positivos do governo não tem se traduzido em melhora na qualidade de vida para a população l Foto: Arquivo pessoal

Para o economista, atualmente, o governo federal avança em alguns pontos e sofre em outros. Orsida aponta os esforços para consolidação da Reforma Tributária (medida impopular ligada à política fiscal) como algo positivo e com possíveis frutos no médio e longo prazo, por exemplo. Para ele, a modernização do sistema tributário brasileiro “é também uma forma do governo sinalizar para o mercado, para investidores, um certo compromisso”.

Ao mesmo tempo, quando fala da política monetária brasileira, o economista é categórico ao afirmar que “há um grande paradoxo econômico”. Para o especialista, o aumento das taxas de juros como forma de desacelerar o consumo se justifica em parte pelo temor de inadimplência, mas, ao mesmo tempo, a alta na inadimplência é posta como um reflexo da alta de juros. Nesse sentido, Orsida descreve a atual política monetária como “perversa” para aqueles que dependem de crédito, como empresários, que precisam de crédito para manter giro de caixa, e a classe mais baixa, que depende de parcelamentos para acessar bens de maior valor.

O economista atribui o atual cenário de incerteza a uma série de fatores. No caso dos combustíveis e dos alimentos, pontos que mais pesam no bolso do cidadão, fatores pontuais e conjunturais justificam a alta recente. Enchentes no Rio Grande do Sul afetam o preço do arroz, chuvas em demasia em Minas Gerais impactam o preço do café, tributações específicas dos estados e municípios, fortalecimento do dólar entre vários outros pontos entram na equação.  

Por fim, a fim de combater um dos maiores inimigos recentes da história brasileira, “o fantasma da inflação”, resta ao governo vigente, independente de qual seja, se manter no malabarismo e administrar as reações do mercado financeiro, o compromisso social com a distribuição de renda e ganho de qualidade de vida, além dos conflitos de interesse que surgem na condução das políticas públicas necessárias.

“Voo de galinha”  

Apesar dos indicadores negativos se tornarem mais presentes no dia a dia do brasileiro, o economista Diego Dias afirma, ao Jornal Opção, que hoje, no cenário brasileiro, não há recessão. Porém, segundo ele, a inflação enfrenta alta recente, os preços dos alimentos e do combustível aumentam e o custo de vida geral sobe. Mesmo assim, há recorde de emprego, aumento do salário mínimo e PIB crescente, sinais de uma economia crescente. 

Os indicadores positivos, conforme apontado por Diego, são “a base de incentivos fiscais”. O especialista explica que “o governo está incentivando, injetando dinheiro na economia com as suas políticas fiscais, você tem uma impressão que o país está crescendo”, entretanto, esse desenvolvimento não se sustenta sozinho ao longo prazo. 

Diego afirma que os indicadores positivos atuais são movidos pela atuação do governo e que não se sustentam sem ele l Foto: Arquivo pessoal.

O especialista faz análise com o “voo de galinha”. “Você cresce [o PIB] dois ou três trimestres, mas depois não consegue se manter só com a política fiscal”. O impulso inicial pode levar a galinha a uma certa altitude, mas logo seu peso vence o esforço inicial e a ave perde altitude. Para o economista, não é como se as intervenções do governo não tenham sua importância, mas “precisamos de outras políticas públicas e outras políticas econômicas para estar, de fato, crescendo de uma forma sustentável”.

O cenário de incerteza que começa a se instalar é resultado não apenas da postura adotada por Lula (PT) e Haddad, mas também “da exagerada demonstração de atitude do mercado”. Diego reforça que existem especialistas de renome apontando as previsões de taxa de juros entre 16% e 17% como um “exagero”. O desgaste político da imagem do atual governo, somado à realidade econômica e às reações dos órgãos financeiros definem, em grande parte, o atual momento.  

“O governo precisa fazer seu dever de casa, que é ter um controle das suas finanças, não injetar, pelo menos, neste momento, dinheiro na economia, porque, se ele injetar mais dinheiro, as pessoas vão consumir mais, consequentemente vai precisar aumentar mais a taxa de juros”, sintetizou. 

Estados Unidos 

Outro ponto que levanta questionamentos sobre os rumos da economia brasileira é a postura de Donald Trump, novo ocupante da Casa Branca, frente à questão comercial internacional. O republicano prometeu uma série de medidas protecionistas que devem fortalecer o dólar e podem encarecer a linha produtiva em todo o mundo. Taxas sobre importação também preocupam alguns setores, como a indústria do aço. 

Apesar do temor com relação à postura mais radical do novo presidente da maior economia do mundo, todos os especialistas ouvidos pelo Jornal Opção recomendam cautela.  “Certamente, tudo que os Estados Unidos faz afeta o Brasil. A gente só tem que entender onde é que vai parar esse ponto final”, colocou Schmidt ao apontar que muitas das promessas de taxação de Trump servem mais artifício para negociação do que medidas imediatas.  

Quando questionado se as medidas do novo ocupante da Casa Branca afetarão direta e imediatamente o cotidiano do cidadão brasileiro, Diego é categórico ao afirmar que “nesse momento, a curto prazo, não”. O momento, portanto, requer cautela e busca por fortalecimento das relações entre os governos dos dois países, a fim de amenizar quaisquer impactos que as medidas protecionistas de Trump possam trazer para o cotidiano da economia brasileira.  

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