Como as franquias mudaram após 5 anos do 1° caso de covid no Brasil: ‘economizamos décadas’

Na última quarta-feira, 26, fez cinco anos da confirmação por parte do Ministério da Saúde do primeiro caso oficial de covid-19 no Brasil – um homem de São Paulo que havia acabado de retornar da Europa. Depois veio o agravamento da crise, com lockdowns e abalo profundo na economia do País e do mundo.

Bolsas de valores derretiam dia após dia, o dólar batia recordes no mercado doméstico e tudo isso era somado a uma espécie de luto coletivo, com mais de 715 mil mortes somente no Brasil, em quase 40 milhões de casos.

Mas houve setores dentro das franquias que deram um salto de décadas, como os mercados autônomos em condomínios. Na avaliação de representantes da área, eles demorariam muito mais a serem aceitos numa situação normal em comparação com o que houve na crise sanitária.

O baque para franquias

Um dos locais que mais sentiram os efeitos da pandemia foram os shoppings, causadores naturais de aglomerações e que concentram, na média, cerca de 20% das operações de franquias no Brasil.

“Como esses shoppings não podiam abrir de jeito nenhum, as operações que dependiam deles foram as que mais sofreram, chegando a ficar meses fechadas”, explica o vice-presidente da vertical de consultoria do Ecossistema 300 Franchising, Lucien Newton.

E este tipo de impacto – não somente em shoppings – pode ser visto por meio dos números oficiais da Associação Brasileira de Franchising (ABF), divulgados à época.

Em 2020, foi a primeira vez em cinco anos em que o faturamento do setor de franquias retrocedeu – foi uma queda de 10,5% na comparação com o último ano antes da pandemia, 2019. As maiores quedas de faturamento ficaram com:

– Serviços educacionais (-10,7%)

– Alimentação (-15,5%)

– Moda (-20,9%)

– Entretenimento e Lazer (-29%)

– Hotelaria e Turismo (-49,8%)

Para se ter uma ideia, o patamar de faturamento pré-pandemia só foi superado nos resultados de 2022.

Áreas que se beneficiaram

Há duas modalidades específicas que cresceram muito durante esse período de pandemia. Inclusive, estão completamente relacionados a questões como distanciamento social, praticidade e segurança:

– Franquias autônomas

– Franquias home based (que funcionam de casa)

Segundo a ABF, atualmente, há mais de 3,3 mil operações de franquias autônomas no Brasil, divididas entre 13 marcas diferentes. Para se ter uma ideia, três anos antes, em 2022, havia menos da metade disso: 1,6 mil lojas abertas – e apenas 4 franqueadoras.

Ainda de acordo com dados da entidade, a maior microfranquia em número de unidades abertas é a market4u, pelo segundo ano consecutivo – justamente uma rede de mercados autônomos.

O case market4u

A empresa foi criada em 2020, e o foco da propaganda do negócio no início era justamente a segurança – por não ter que lidar com um operador e tudo ser feito sozinho, desde a seleção de produtos até o pagamento.

Em 2021, a empresa já tinha quase mil unidades em operação – boom causado justamente por uma demanda reprimida da pandemia.

Nos anos seguintes, algumas dessas lojas foram transferidas ou fechadas, pois haviam sido abertas em espaços que não tinham tanta demanda no pós-pandemia. Atualmente, a marca tem quase 2,2 mil operações ativas.

Antes da pandemia, porém, a maior dificuldade do modelo de negócio era convencer condomínios e empresas que aquilo poderia ser uma boa ideia, conforme conta o CEO da marca em entrevista ao Estadão, Eduardo Córdova.

Segundo ele, não fosse a mudança de hábitos impulsionada pelo período de lockdowns, que beneficiou maior utilização de compras online, internet banking e pagamento sem funcionários nos caixas, talvez eles não tivessem passado de 100 unidades em operação.

“Isso nos economizou facilmente umas duas décadas de trabalho de convencimento e vendas. Porque, antes, nós perdíamos muito tempo tentando mostrar para síndicos que o nosso negócio faria muito sentido naquela praça. A coisa mais cara que existe nos negócios é mudar o hábito do consumidor”, declara o fundador da marca.

E o mesmo aconteceu com outras diversas empresas. “A concorrência explodiu também. Muitas fecharam depois de um tempo, até que se estabilizou no que temos hoje.”

Outras marcas

Uma das marcas que ficaram é a Minha Quitandinha, que também surgiu em 2020 e hoje conta com pouco mais de 300 unidades abertas.

Outros setores também foram beneficiados por essa maior disposição do consumidor final de fazer tudo sozinho.

A Airlocker, que presta serviço de armazenamento de itens em condomínios e complexos comerciais, surgiu em 2019 e, desde 2022, atua no franchising. Atualmente conta com quase 200 unidades.

A Lavô, de lavanderias autônomas, também nasceu em 2020 e já conta com mais de 600 lojas. Em muitas dessas operações, o franqueado atua de casa na maior parte do tempo, no formato home based.

O franqueado tem que comparecer ao local do negócio apenas na hora de checagem de equipamentos, limpeza ou reposição de estoque. Se houver a contratação de um funcionário, por exemplo, tudo poderá ser administrado de casa.

O home based

Em 2020, quando começou o surto de covid-19 no Brasil e ano do primeiro dado existente sobre o tema por parte da ABF, 7,1% das operações existentes no País eram home based, de acordo com a entidade. E, durante a pandemia, houve um crescimento forte na proporção desta modalidade em relação às operações no franchising, sendo que, em 2022, esta fatia atingiu seu maior pico: 14,8%.

Newton, da 300, ressalta que houve crescimento, sim, no número de unidades com trabalho diretamente da casa do franqueado. Porém, este bolo maior também teve como contribuição fechamentos de unidades tradicionais – com pontos físicos – devido à crise sanitária. Ao fim de 2020, para se ter uma ideia, cerca de 4 mil unidades de franquias haviam sido fechadas ao todo e por volta de 100 mil postos de trabalho perdidos.

A estabilização veio no ano passado, em que 7,8% das operações em funcionamento no franchising no Brasil eram sediadas nas respectivas residências dos empreendedores. “É uma tendência que veio para ficar”, ressalta Newton, da 300.

“Com a pandemia, o home based se tornou muito mais aceito como um todo. Antes, se falava muito menos nesse modelo de trabalho e agora é muito mais frequente. Há muitos casos de franqueados que procuram a marca e, quando vão falar o motivo de terem cogitado aquela determinada empresa, indicam que a possibilidade de trabalhar de casa, com ganho de qualidade de vida, foi determinante”, explica o diretor de microfranquias e novos negócios da ABF, Felipe Buranello.

Herança da pandemia

Esse boom de franquias autônomas e home based não é por acaso, de acordo com Newton, da 300.

O choque da pandemia exigiu capital de giro por muito tempo para manter o negócio de portas abertas, já que não havia receita ou ela diminuiu muito. Com isso, cresceu a necessidade de cortar custos fixos.

Justamente franquias home based e autônomas se encaixam perfeitamente nessa questão. Quando o negócio funciona em casa, utiliza a estrutura que o empreendedor já tem, sem tantos acréscimos de custos.

Para modelos autônomos, não há tanto gasto com funcionários, as contas de consumo, como água e luz, são menores, assim como o aluguel, pois o espaço é compacto.

Estadão conteúdo

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