Europa deve se preparar contra a Rússia sem ajuda dos EUA, diz Macron

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VICTOR LACOMBE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

O presidente da França, Emmanuel Macron, fez um pronunciamento oficial à nação nesta quinta-feira (5) no qual disse que seu país e aliados da Europa precisam se preparar para conter “a ameaça russa” sem a ajuda dos Estados Unidos -e perguntou: “quem pode crer que a Rússia de hoje vai parar na Ucrânia?”.

O discurso de Macron acontece dias depois do bate-boca público na Casa Branca entre os presidentes dos EUA, Donald Trump, da Ucrânia, Volodimir Zelenski, um desentendimento público ao qual se seguiu a decisão do americano de suspender o auxílio militar a Kiev para pressionar por um acordo de paz rápido com Moscou.

A sequência de acontecimentos precipitou o movimento de países europeus como a França, o Reino Unido e a Alemanha de rearmar o continente e buscar uma arquitetura de segurança própria, independente da Otan. Analistas apontam que a aliança militar ocidental liderada pelos EUA só tem força como dissuasão se eventuais adversários estiverem certos de que os países virão ao resgate uns dos outros –e as falas e ações de Trump vêm contribuindo para erodir essa certeza.

No pronunciamento, Macron prometeu elevar o orçamento militar da França para atingir EUR 70 bilhões até 2030, projetando que, no mesmo ano, a Rússia já terá sido capaz de se recuperar de suas perdas na Ucrânia e terá um efetivo militar da ativa de 1,5 milhão de soldados, com milhares de tanques e caças à disposição –em comparação, o efetivo militar dos principais países da União Europeia hoje é de pouco mais de 1 milhão de soldados da ativa, segundo estimativa do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS).

“Os franceses estão preocupados, e com razão, sobre a Guerra da Ucrânia e sobre os Estados Unidos, que são hoje menos favoráveis a [Kiev] e criam dúvidas sobre o que virá a seguir”, disse Macron. “É preciso dizer que nossa prosperidade e segurança se tornaram mais incertas.”

O presidente francês defendeu a postura de seu governo de apoiar a Ucrânia militarmente contra a Rússia e de levantar sanções contra Moscou. “Não é apenas o povo ucraniano que luta corajosamente por sua liberdade, mas também nossa segurança que está ameaçada”, afirmou.

“A ameaça russa está aqui e afeta todos os países europeus. Foi a Rússia que tornou este um conflito mundial, que assassina opositores fora de suas fronteiras, que manipula eleições. Nesse mundo perigoso, ser mero espectador seria uma loucura”, prosseguiu Macron, que anunciou uma reunião dos chefes das Forças Armadas dos países da União Europeia em Paris nos próximos dias para discutir a guerra.

Como contraponto à pressão de Trump por uma paz o mais rápido possível, Macron disse que o fim do conflito na Ucrânia “não pode ser alcançado a qualquer custo e sob o ditame russo. A paz não pode ser a capitulação da Ucrânia, seu colapso. E nem pode resultar em um cessar-fogo frágil”.

Em outro momento crucial do discurso, Macron deu um passo na direção de colocar outros países europeus sob o guarda-chuva nucelar francês, propondo “abrir um debate” sobre a possibilidade de proteger vizinhos com a dissuasão nuclear francesa, mas mantendo a “decisão final” sobre o uso das armas de destruição em massa nas mãos do presidente da França.

Paris, Londres e Moscou são as únicas potências nucleares da Europa, mas os EUA têm bombas atômicas armazenadas em uma série de países do continente, como a Itália, a Alemanha, a Holanda e a Turquia. A Rússia é o país com o maior número de ogivas declaradas do mundo.

“Quero acreditar que os Estados Unidos continuarão ao nosso lado”, disse Macron ao concluir o discurso. “Mas a Europa precisa se preparar se isso não for mais verdade.”

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