Líder do TCP pode ser o primeiro traficante enquadrado por terrorismo no Brasil

Álvaro Malaquias Santa Rosa, conhecido como Peixão, é atualmente o criminoso mais procurado do Rio de Janeiro. Como chefe do tráfico no Complexo de Israel e um dos principais líderes do Terceiro Comando Puro (TCP), ele domina territórios em Parada de Lucas e Cidade Alta, em Cordovil. Sua influência se expande além das fronteiras do estado, sendo um elo importante na aliança entre facções criminosas de outras regiões.Peixão é acusado de promover terror social e, além das investigações conduzidas pelas forças de segurança estaduais, agora também será investigado pela Polícia Federal sob a suspeita de terrorismo. Caso seja formalmente acusado e condenado, ele poderá enfrentar uma pena que varia de 12 a 30 anos de prisão, conforme previsto na Lei Antiterrorismo (Lei nº 13.260/2016).

“Peixão” após um culto evangélico

|  Foto: Reprodução | Redes Sociais

O uso da religião como estratégia de controleDiferente de outras facções, o TCP se destaca pelo uso de simbologia religiosa para legitimar seu poder e influenciar as comunidades sob seu domínio. Muitos de seus líderes são evangélicos e utilizam a fé como ferramenta de manipulação social.Os traficantes se autoproclamam “soldados de Jesus” e se identificam como a “Tropa de Aarão”, referência ao irmão mais velho de Moisés. A frase “Jesus é dono do lugar” é frequentemente vista em pichações e faixas espalhadas pelos territórios dominados pelo TCP.

Um dos quartéis generais da facção é o Complexo de Israel

|  Foto: Reprodução / Fabiano Rocha /Agência O Globo

Quem chega à estação de trem de Parada de Lucas, uma das principais áreas sob controle de Peixão, é recebido por uma bandeira de Israel e por uma placa com a inscrição: “Seja bem-vindo ao Complexo de Israel.” O uso desse símbolo vai além de uma questão religiosa, funcionando também como uma estratégia de domínio territorial e imposição ideológica.Peixão se apresenta como evangélico e usa passagens do Antigo Testamento para justificar sua expansão e confrontos armados, afirmando que seu papel é “libertar” as comunidades de seus inimigos, que incluem o Comando Vermelho, a milícia e as forças de segurança pública.O enquadramento por terrorismoO advogado Vinícius Dantas, mestre em segurança, direito penal e direitos humanos pela Universidade de Salamanca, na Espanha, e pós-graduado em criminologia, esclareceu os critérios para enquadramento na Lei Antiterrorismo:

“Terrorismo consiste na prática, por um ou mais indivíduos, de atos previstos neste artigo (artigo 2º da Lei Antiterrorismo, nº 13.260/2016) por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoas, patrimônio, a paz pública e a comunidade pública.”

O especialista detalha ainda que o parágrafo primeiro do artigo 2º estabelece como atos de terrorismo:”Usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenosos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos e promover destruição em massa.”Ele destaca que o inciso 5 do parágrafo primeiro é fundamental para o enquadramento de Peixão:”O que se enquadraria mesmo aqui seria o inciso 5, que trata de atentar contra a vida ou a integridade física de uma pessoa.””São aqueles atos descritos no artigo 2º e seus parágrafos. No caso em questão, para enquadrar o traficante, aplicar-se-ia o inciso 5 do parágrafo primeiro do artigo 2º: atentar contra a vida ou a integridade física de uma pessoa.”Dantas também enfatiza que a motivação religiosa pode ser um fator determinante:”Se somarmos isso ao caput do artigo, que menciona motivação por religião, etnia, raça, entre outros fatores, temos um enquadramento possível.””Se indivíduos estão usando a religião para causar terror na sociedade, impor uma crença, estabelecer algum tipo de rito ou proibir a prática de determinada religião ou fé, e se isso for feito com essa motivação exclusiva, então, sim, eles podem ser enquadrados na Lei Antiterrorismo, no artigo 2º da Lei nº 13.260/2016.”A investigação sobre Peixão está em curso, e sua inclusão como suspeito de terrorismo pode representar um novo capítulo no combate às facções criminosas no Brasil. Caso seja indiciado e condenado por esse crime, o líder do TCP poderá enfrentar um regime de prisão mais severo, sob jurisdição da Justiça Federal.

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