Dólar fecha em forte queda e Bolsa dispara 2% em dia de apetite por risco, com Trump ainda em foco

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

O dólar teve forte queda de 0,92% nesta sexta-feira (14) e encerrou a semana cotado a R$ 5,743, em dia marcado por grande apetite por risco nos mercados globais.

O bom humor contagiou a Bolsa brasileira, que disparou 2,64%, a 128.957 pontos, amparada pela força dos pesos-pesados Vale, Petrobras e setor bancário.

A pressão que tomou conta dos mercados globais nos últimos dias deu trégua nesta sessão, ainda que as preocupações sobre o tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, continuem.

“Houve muito ruído associado às tarifas de Trump, tema que, vale deixar claro, ainda vai voltar a afetar os mercados globais. Não podemos declarar vitória sobre esse assunto, mas o ruído foi cessado um pouco hoje, e os investidores aproveitaram para caçar”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.

Ele explica que os temores com o tarifaço derrubaram índices acionários ao longo das últimas semanas, e o valor das ações das empresas “ficaram muito mais abaixo do que de fato deveriam valer”.

A sessão de quinta-feira, por exemplo, foi marcada pelo tombo do S&P 500, que reúne as 500 principais empresas norte-americanas e que caiu 1,31%, a 5.521 pontos -uma queda de mais de 10% em relação ao fechamento recorde no mês passado. A métrica coloca o índice em território de correção, definido como uma queda de pelo menos 10% a partir de um pico.

Nesta sexta, por outro lado, Wall Street se recuperou do baque, e o próprio S&P 500 devolveu as perdas da véspera ao subir mais de 2%. “É um dia de recuperação tradicional, após forte liquidação”, diz Spiess.

Para além da dinâmica usual dos mercados, outros fatores entram na conta. O Congresso dos EUA está próximo de aprovar uma lei provisória para financiar o governo federal e, assim, evitar uma paralisação de atividades a partir de sábado.

Os democratas recuaram do impasse que até então estava impedindo a aprovação da lei. A ala de oposição ao governo republicano tem demonstrado insatisfação com a campanha de Trump e Elon Musk, chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês), para reduzir a força de trabalho federal.

Com “o alívio no risco de ‘shutdown’ nos Estados Unidos”, na análise de Marcio Riauba, chefe da mesa de operações da StoneX Banco de Câmbio, parte das incertezas dos investidores se dissipou.

Além disso, a China anunciou medidas adicionais de estímulo ao consumo. O BC chinês irá cortar taxas de juros e o índice de reservas obrigatórias dos bancos para incentivar tomadas de empréstimos e usos de cartões de crédito. O movimento deu força ao mercado de commodities, o que amparou países de forte pauta exportadora, como o Brasil.

Não à toa, Vale e Petrobras decolaram na Bolsa, a 3,17% e 3,48%, respectivamente. As duas empresas de maior peso no Ibovespa, já atraentes pelo apetite por risco redobrado, se beneficiaram da valorização de suas commodities de referência. O minério de ferro subiu 2,32%, enquanto o petróleo Brent avançou 1%, na esteira das negociações sobre a guerra na Ucrânia.

A guerra comercial instalada por Trump, porém, segue no radar. Depois que as tarifas de importação de 25% sobre produtos de aço e alumínio entraram em vigor na quarta-feira, países afetados retaliaram. O Canadá, principal parceiro comercial dos Estados Unidos na categoria, disse que irá impor 29,8 bilhões de dólares canadenses (R$ 120,3 bi) em tarifas a partir desta quinta.

Já a União Europeia anunciou tarifas retaliatórias sobre 26 bilhões de euros (R$ 164,9 bi) em produtos norte-americanos a partir do próximo mês, como barcos, uísque e motocicletas Harley Davidson. Outras categorias também podem entrar na lista.

Trump, em resposta às represálias, subiu o tom. Na quinta, ameaçou aplicar uma taxa de 200% sobre vinhos e outros produtos alcoólicos provenientes da UE caso o bloco não retire a tarifa sobre o uísque.

Ele, no entanto, disse continuar aberto a negociações e que tarifas mais altas não são do interesse de ninguém.

O tarifaço tem inspirado cautela nos mercados globais. A maior preocupação é que a guerra comercial escale e distorça cadeias de suprimentos globais, o que pode encarecer diversas categorias de produtos.

No caso específico dos Estados Unidos e de outras potências econômicas, como a Alemanha, há ainda temores de que o tarifaço provoque uma recessão.

“Está ficando muito agitado agora, porque as tarifas estão indo e vindo e ninguém sabe até onde isso pode ir”, disse Ipek Ozkardeskaya, analista sênior do Swissquote Bank.

“Sejam elas efetivas outáticas de negociação, as tarifas aumentam as expectativas de inflação, e é por isso que os mercados estão em pânico neste momento.
Se o tarifaço aumentar o custo de vida dos norte-americanos, é possível que a briga do Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos) contra a inflação sofra um revés e force a manutenção da taxa de juros em patamares elevados. Quanto maiores os juros por lá, mais atrativos ficam os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA, os chamados treasuries, o que fortalece o dólar globalmente.
Juros altos também inibem a atividade econômica, que já tem dado sinais de desaceleração, mas o Fed ainda vê os principais indicadores econômicos em “progresso contínuo”.

A autoridade monetária pausou o ciclo de cortes na taxa no início do ano, sob justificativa de resiliência do mercado de trabalho e inflação ainda acima da meta de 2%. Na reunião da próxima semana, a expectativa é que os juros sejam mantidos novamente na faixa atual de 4,25% e 4,5%.

Uma bateria de dados recentes, porém, renovou expectativas de que o ciclo de afrouxamento seja maior do que o esperado, com possibilidades de um próximo corte na reunião de junho.

Já na cena doméstica, a dívida bruta do Brasil registrou uma queda inesperada em janeiro e foi a 75,3% do PIB, contra 76,1% no mês anterior. A expectativa de economistas consultados pela Reuters era de alta para 76,2%.

Já a dívida líquida foi a 60,8% em janeiro, de 61,2% em dezembro e projeção de 61,3%.

O dado “não atrapalha” os ativos brasileiros, na visão de Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX. O verdadeiro foco, segundo ele, está no exterior.

Na ponta macroeconômica, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) informou que as vendas varejistas no Brasil apresentaram recuo em janeiro pelo terceiro mês consecutivo, ainda que tenham ficado um pouco acima do esperado.

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