Suplementos podem ajudar a envelhecer melhor, mas não tratam doenças nem substituem dieta e exercícios

GABRIEL ALVES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A vida seria muito mais fácil se houvesse uma resposta simples e definitiva sobre o que podemos adicionar às nossas dietas para combater ou atenuar o inexorável processo de envelhecimento, mas as recomendações sobre o que devemos ingerir são, por excelência, individuais. Não é todo mundo que vai precisar receber injeções periódicas para repor vitamina B12 (como acontece com alguns vegetarianos ou com quem fez cirurgia bariátrica) ou tomar comprimidos com magnésio (por exemplo, algumas pessoas com diabetes e com doença de Crohn).

A B12 é uma das vitaminas do complexo B que no corpo humano atuam na maturação das hemácias (células vermelhas do sangue) e na síntese de DNA, entre outros processos. Alguns estudos associaram níveis baixos da B12 a um maior risco de demência.

E se suplementássemos, então, quem está em risco de desenvolver demência? Uma meta-análise (estudo que agrega resultados de diversos outros) publicada na revista Nutrition Reviews mostrou que é possível reduzir o risco dessa forma. Por outro lado, para quem já tem a doença, outros estudos não conseguiram mostrar benefício. Talvez seja melhor prevenir do que remediar.

Para manter as vitaminas do complexo B em dia, é possível apostar em alimentos como fígado, peixes e carne bovina, assim como ovos e laticínios. Esses alimentos também são boas fontes de vitamina D e, no caso dos laticínios, de cálcio.

“Hoje existe uma ojeriza infundada contra o leite. Não há absolutamente nada comprovado cientificamente contra o leite. Pelo contrário, é o melhor fornecedor de cálcio e a fonte mais bem absorvida desse mineral. Quando os hábitos de vida não permitem que o consumo de leite e derivados supra a necessidade de cálcio, é necessário recorrer à suplementação”, afirma o nutrólogo Nelson Lucif Jr., responsável pelo departamento de geriatria da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia).

Segundo ele, é raro uma pessoa idosa consumir quantidades suficientes de laticínios para atingir a recomendação diária do mineral. “Por isso, na maioria dos casos, a suplementação se torna indispensável.”

Algo parecido, afirma o médico, acontece com a vitamina D. Boa parte da população tem níveis abaixo do que os especialistas consideram ideal para a saúde dos ossos, dos dentes e dos músculos. Para os idosos, a situação pode ser especialmente crítica. É a exposição da pele ao sol que promove a conversão de vitamina D no organismo, mas esse mecanismo perde eficiência com o tempo. Isso sem falar da maior suscetibilidade dos mais velhos a cânceres de pele, lembra Nelson Lucif.

Outro problema nutricional comum na terceira idade é a proteína, nem sempre consumida na porção adequada. Fica mais difícil mastigar, deglutir e até mesmo adquirir alimentos como carnes e ovos na quantidade ideal. Sem proteína (e sem exercício físico, vale notar), é mais difícil manter a quantidade de músculo. E a quantidade de músculo está intimamente relacionada com a saúde em geral, incluindo a prevenção de fraturas.

Mas nem toda proteína é igual. Aquelas menos complexas (portanto, menos nutritivas), como colágeno, não são tão bem reputadas. “Embora o colágeno seja essencial para a saúde da pele, a evidência de que suplementos de colágeno realmente retardam o envelhecimento da pele é limitada. Alguns estudos mostraram melhorias em firmeza e elasticidade, mas esses efeitos são modestos e ainda carecem de validação mais ampla”, afirma Manuela Dolinsky, professora da UFF (Universidade Federal Fluminense), nutricionista e coordenadora do ambulatório de dietética e alimentos funcionais da instituição.

Uma das hipóteses sobre o envelhecimento é que ele se dá, ao menos em parte, pelo acúmulo de danos provocados pelos radicais livres, resultantes de um processo conhecido como estresse oxidativo. Apostar nos antioxidantes então seria uma boa, certo? Parece que não.

“A ideia de que antioxidantes, como vitamina C ou E, podem neutralizar o envelhecimento celular tem sido amplamente promovida, mas há pouco apoio clínico que sugira que doses altas dessas substâncias alterem o curso do envelhecimento”, diz Dolinsky.

Há ainda efeitos colaterais que podem ser associados ao uso de suplementos. O excesso de vitaminas A, D, E e K pode causar danos ao fígado, aos rins e aos ossos. E há risco de interação medicamentosa. No caso do ômega 3, tido como protetor do sistema cardiovascular (os resultados de estudos são inconsistentes), há risco de o tiro sair pela culatra e ele gerar fibrilação atrial.

Outros candidatos a benfeitores do organismo são a coenzima Q10, que promete auxiliar a função das mitocôndrias -a usina de energia das células, que perde eficiência com a idade-, a curcumina, com ações anti-inflamatórias e antioxidantes, o gingerol, molécula do gengibre, e o resveratrol, que aparece nas uvas e em vinhos, ambos com ação antioxidante.

Apesar de estudos mecanísticos e até mesmo em modelos animais que embasam as alegações, há de se considerar que a evidência de eficácia dos suplementos, até o momento, é modesta ou mesmo ausente, sem o estabelecimento de quantidades que seriam ao mesmo tempo eficazes e seguras em humanos.

Embora a suplementação possa ser útil em casos específicos de deficiências nutricionais ou condições de saúde, ela não substitui os benefícios de um estilo de vida saudável, lembra Dolinsky.

“A atividade física regular, a manutenção de peso e composição corporal saudáveis e uma alimentação rica em frutas, vegetais, fibras e gorduras saudáveis são reconhecidas como práticas fundamentais para a promoção da longevidade.”

Por sua vez, os probióticos, também um tipo de suplemento, têm cada vez mais acumulado evidências da capacidade de influenciar o organismo por meio da modulação da microbiota (a comunidade de microrganismos que habita nosso corpo). Os efeitos já foram notados na saúde intestinal e ginecológica, no diabetes e na depressão, entre outros. Há, contudo, uma série de possibilidades entre espécies e cepas, e faltam estudos que balizem as condutas.

“Suplementos não são baratos, especialmente se considerarmos o benefício duvidoso que eles podem oferecer. Por outro lado, diversos estudos mostram redução de doenças crônicas com padrões alimentares baseados em alimentação saudável (com alimentos in natura e pouco processados) e atividade física”, diz Luciana Verçosa Viana, chefe do serviço de nutrologia do Hospital das Clínicas de Porto Alegre da UFRGS.

“Além disso, é extremamente importante que as pessoas informem a seus médicos que fazem uso de suplementos, pois pode haver interação entre suplementos e medicações”, acrescenta. Por exemplo, a vitamina C pode interferir em tratamentos com anticoagulantes (varfarina), hormônios (estrogênio) e remédios para colesterol (estatinas).

Para Dolinsky, a busca por “pílulas milagrosas” nos suplementos é reflexo de uma combinação de fatores psicológicos e culturais.

“A ideia de que um produto pode evitar os efeitos do envelhecimento é atraente porque promete uma solução simples, em vez de mudanças no estilo de vida que exigem esforço contínuo, como dieta balanceada e exercício físico”, afirma. “O efeito de qualquer substância será mais robusto quando associado a um estilo de vida saudável.”

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