Amores Terás Vivo, romance de Wilson Loria: a marcha sensorial rumo à liberdade

Whisner Fraga

“Amores Terás Vivido”, o mais recente romance de Wilson Loria, publicado pela Editora Patuá, em 2024, narra a história de Nelson, um jovem que deixa Cuba e se muda para os Estados Unidos, no início da Revolução Cubana. O leitor acompanha a jornada do protagonista, desde a fuga até as experiências no novo país, explorando temas como liberdade, paixão e busca pela identidade. A opressão política e social, o desconforto com as mudanças na ilha, o medo da repressão e, principalmente, um profundo desejo por liberdade sexual são fatores que impulsionam essa partida.

A família de Nelson desempenha papel fundamental em toda a obra. O pai é o responsável pela compra das passagens, a mãe o suporte emocional, o amor incondicional, os irmãos como símbolos da relação entre passado e presente. A lembrança dos entes queridos, que permanecem em Cuba, é muito presente no romance, e simbolizada por cartas recebidas, que dão, ao leitor, um panorama do contexto cubano da época.

Os Estados Unidos, país retratado como a terra da oportunidade, acolhem Nelson, que prospera, inicialmente no ramo imobiliário e, mais tarde, com a abertura de um disco-piano-bar. A vida amorosa dele tem altos e baixos, descritos de forma competente na obra. Com Ronald, como ele, amante da ópera “La Bohème”, experimenta a calmaria, as conversas sobre música e afetos. Com Gino, vive a urgência do desejo e, com Carlos, experimenta o ciúme, a frustração e a desconfiança.

Linguagem vibrante e personagens bem caracterizados

A obra possui duas qualidades fundamentais para um romance: a linguagem — vibrante, eficiente, lírica, instigante — e os personagens, ricos e bem caracterizados.

Wilson Loria, escritor | Foto: Facebook

O estilo de Wilson Loria privilegia os detalhes descritivos, trazendo imagens muito claras e precisas, que contribuem com uma atmosfera cativante, que deixará o leitor preso à trama.

Outro recurso muito bem utilizado é a citação de grandes autores da literatura mundial, como Tennessee Williams, Reinaldo Arenas e Gabriel García Márquez. Aliás, as referências são múltiplas e abrangem outras artes, também, como a música e o cinema.

Os temas abordados em “Amores Terás Vivido” são de fundamental importância e universais. A busca por uma identidade que defina inteiramente o protagonista, as raízes, as dificuldades da imigração, as complexidades das relações amorosas, a luta pela aceitação da própria sexualidade, a liberdade, são abordados no romance de maneira firme, sem panfletarismo ou julgamentos morais. Prova disso é o próprio Nelson, um personagem complexo, retratado em todos os defeitos e qualidades, de forma muito competente.

Situações descritas são memoráveis

Como o romance é narrado em primeira pessoa, o leitor terá o ponto de vista do narrador-personagem, ora condescendente com as pessoas e com o mundo, ora implacável. De todo mundo, graças às descrições minuciosas, aos inúmeros detalhes apresentados, as situações descritas tornam-se memoráveis. Um autor pode desejar algo mais para sua obra?

Todos os sentidos são evocados na narrativa: a audição, por meio dos discos, das várias referências musicais, o paladar, por meio da descrição de inúmeras comidas e bebidas, o tato, representado pelo toque na areia, a maciez do cobertor, a aspereza da enxada, a visão, ao descrever as cenas de filmes, as belezas das atrizes americanas, as paisagens e atmosferas do Rio de janeiro, de Cuba, de Porto Rico, as cores e, finalmente, o olfato, representado por um estranho perfume, que remete à saudade, à ternura e, sobretudo, ao amor.

“Amores Terás Vivido” apresenta ao leitor a força e a importância das origens, ainda quando a distância física e ideológica se impõe. As trocas constantes de cartas com a família em Cuba trazem sabores, sons, saudades e não deixam que o espírito de luta esmoreça em Nelson. As evocações constantes de uma terra amada e odiada reforçam o caráter dúbio que molda a memória e a condição humana. Um romance muito bonito, bem escrito e envolvente.

Whisner Fraga é professor universitário e autor de mais de uma dezena de livros de ficção, tendo contos traduzidos para o inglês, alemão e árabe. Escreve para o coletivo “Crônica do dia” e mantém o canal “Acontece nos livros”, no YouTube, em que resenha obras de escritores contemporâneos. É editor na Sinete.

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