Ala do governo é cética sobre medidas para baratear alimentos e defende fim de ruídos

ADRIANA FERNANDES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Uma ala do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é cética quanto à chance de medidas em estudo nos ministérios surtirem efeito significativo para baratear o preço dos alimentos.

Uma autoridade econômica disse à reportagem que a melhor contribuição do governo é evitar ruídos desnecessários e “parar de criar confusão” que leve à alta do dólar, com impacto negativo nos preços dos alimentos.

A avaliação é que a redução da alíquota do imposto de importação de alimentos, anunciada nesta sexta-feira (24) pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, pode ajudar paliativamente, mas não ataca o cerne do problema: taxa de câmbio alta e demanda aquecida.

A declaração de Rui Costa, porém, representou um alívio para integrantes do governo que veem com preocupação o risco de ideias heterodoxas, como a taxação das exportações de alimentos, ganharem espaço nas discussões e acabarem sendo adotadas. O entendimento é que é melhor isentar a importação do que taxar a exportação.

O ministro foi no caminho contrário ao que o mercado temia, o que foi considerado positivo por essa ala do governo. Um auxiliar de Lula definiu a taxação das importações de “medida anti-Kirchner”. Uma referência à ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner, que aumentou os impostos sobre as exportações de grãos, gerando uma crise com locautes ruralistas, bloqueios de estradas, desabastecimento e aumento da inflação.

Um ruído citado como exemplo, ainda sentido no mercado nesta sexta-feira, foi a informação de um estudo do governo para fornecer alimentos com custo reduzido por meio de uma rede popular de abastecimento, nos moldes do que o Farmácia Popular faz em relação a medicamentos.

Por outro lado, a informação de Haddad que a regulamentação da portabilidade do vale-refeição e vale-alimentação pode ajudar a baratear os preços de alimentos foi ignorada pelos agentes do mercado.

Um ministro do governo, que também falou na condição de anonimato, ressaltou que neste momento é melhor concentrar os esforços em medidas que possam retomar a credibilidade da política fiscal para coordenar as expectativas e ajudar na queda do dólar, que tem levado à alta dos preços. Ele disse que não há outra saída porque a inflação alta é resultado de “dólar, sazonalidade e risco fiscal”.

O ministro ressalta que o governo precisa aproveitar o momento atual em que a cotação do dólar voltou ao patamar abaixo de R$ 6 para acentuar ainda mais tendência de queda.

Em tom irônico, um auxiliar de Lula comentou que para ter impacto só fazendo um “Tinder das vaquinhas” em razão da falta de rebanho por causa do abate recorde de reprodutoras bovinas. Esse quadro do ciclo de produção vem afetando os preços das carnes.

Para Carlos Thadeu Freitas Filho, da BCG Liquidez, especialista em inflação de alimentos, a taxação de exportações de alimentos teria um efeito no curto prazo para derrubar a inflação, mas acabaria causando um estresse e impacto no câmbio. Isso levaria a perdas ao final maiores do que ganhos, além de implicações de médio prazo negativas.

“O estresse seria tão grande neste momento, que o real ia depreciar tão forte por causa disso. Eu duvido que a pressão política do central é tão intensa nessa área [no agronegócio] que eu acho pouco provável”, diz.

“Isso gera um estrago na cadeia de produção tão grande, que você consegue controlar os preços agora no curto prazo, mas no médio prazo os preços vão ser muito maiores”, acrescenta.

O especialista vê como inócuas as medidas em estudo pelo governo, inclusive a de redução do imposto de importação. Na sua avaliação, a melhor coisa para controlar a inflação é ter uma economia estável para que outros grupos da inflação compensem a alta dos preços da alimentação.

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