Chapada dos Veadeiros ocupa 1º lugar em ranking de parques para o astroturismo; confira outros pontos de visitação no Brasil

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Por Fernanda Diniz
Agência de Notícias CEUB

“O principal no trabalho que eu faço é gerar conexão das pessoas com a natureza. Para mim, o mais importante é isso. A informação pode ser esquecida, mas a conexão jamais será”, afirma o guia de turismo Gustavo Maia, que realiza trilhas na Chapada dos Veadeiros, desde o ano de 2021.

A Chapada dos Veadeiros (GO), a 235 km de Brasília (DF), é considerada excelente para atividade de astroturismo e ocupa o primeiro lugar nessa categoria no IASTRO, índice que avalia o potencial para o exercício do turismo relacionado aos astros em parques nacionais.

O Índice foi lançado no 3º Congresso Brasileiro de Trilhas, que aconteceu em novembro de 2024, na cidade de São Paulo (SP), pelos idealizadores Dennis Hyde e Letícia Alves com apoio dos profissionais: Vitor Barbato, turismólogo, e Daniel Mello, astrofísico e astrônomo.

Conhecido como Thor, o guia Gustavo Maia afirma que, dos grupos e das pessoas que ele conduz pelas trilhas da Chapada, elas costumam relatar que é “surreal ver aquele céu”, uma experiência única que a Chapada dos Veadeiros proporciona.

O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros tem gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e está localizado entre os municípios de Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Teresina de Goiás, Nova Roma e São João d’Aliança.

São mais de 240 mil hectares de Cerrado abrigando nascentes, cursos d’água, rochas e uma rica fauna e flora. Desde 2001, é Patrimônio Natural da Humanidade.

Céu na Chapada dos Veadeiros

Foto: Arquivo Pessoal do guia Gustavo Maia

A Chapada dos Veadeiros, onde estão as trilhas da Travessia das Sete Quedas e a do Sertão Zen, está pronta para ser certificada, segundo o economista idealizador do projeto IASTRO, Dennis Hyde.

Ele também pontua que o parque está cada vez mais desenvolvendo trilhas, lugares apropriados para camping, com banheiro seco, com ordenamento, de uma forma acessível para as pessoas e para o astroturismo.

Segundo o guia turístico Gustavo Maia, a Chapada tem como atrativo as trilhas noturnas Dos Saltos, Carrossel e Corredeira e a trilha da Travessia das Sete Quedas, onde Gustavo leva os grupos para realizar o passeio.

A atividade é feita em dois dias. O primeiro tem, aproximadamente, 17 km e o segundo, cerca de 6 km. De acordo com ele, o acampamento é promovido com o slogan: “para que um hotel cinco estrelas se podemos acampar num hotel com milhões de estrelas?”.


Zen

Para o Sertão Zen, uma caminhada de cerca de 19 km, Gustavo a considera como o melhor lugar para ver o céu, porque é preciso fazer um percurso para chegar até o acampamento.

“Para mim é surreal ver o céu de lá porque tem uma altimetria significativa para sair de Alto Paraíso; você caminha vários quilômetros se distanciando das luzes da cidade; é surreal desfrutar do céu estrelado do Sertão Zen”, comenta Gustavo, Thor.

Crédito: Arquivo Pessoal do guia Gustavo Maia

Astroturismo

Mas, afinal de contas, o que é o astroturismo? Essa atividade turística é voltada para a visitação de locais adequados para a contemplação dos astros e costuma acontecer em lugares com poluição luminosa reduzida, envolvendo atividades de geoturismo, ecoturismo e turismo científico.

A qualidade do céu se relaciona de maneira direta com a poluição luminosa, geralmente ligada às cidades que ficam próximas aos parques, e com a climatologia. Com um clima menos chuvoso e com menos nebulosidade, é possível ver o céu com maior facilidade.

No Brasil, estão catalogados 75 parques nacionais dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), e todos estão presentes no IASTRO, destes, 10 são de multifronteira (parques cujas áreas abrangem mais de um estado).

O projeto IASTRO faz parte de uma jornada que teve início em 2021, com a expedição do casal Dennis Hyde e Letícia Alves pelos 75 parques nacionais do Brasil. Dennis e Letícia documentaram a experiência em seu blog, Entre Parques BR.

Dennis relata o seu encanto pelo céu e o interesse que construíram. Ele afirma que para além dos benefícios para a saúde humana, “os astros talvez sejam a cereja do bolo; é maravilhoso poder olhar as estrelas e poder reconhecer, poder ver a Via Láctea a olho nu”, diz.

Reconexão com a natureza


Um dos principais objetivos do astroturismo é fazer essa reconexão das pessoas com o céu estrelado. “A astronomia é a ciência mais antiga que a gente conhece e ela começou justamente com a curiosidade das pessoas de entender as coisas que acontecem no céu”, afirma o astrônomo Daniel.

Ele também explica que essa atividade é um incentivo para que as pessoas estabeleçam cada vez mais essa reconexão com a natureza, e, ao mesmo tempo, promove de maneira a mais direta possível a conscientização sobre os impactos ambientais da poluição luminosa no meio ambiente, na fauna e na flora, e até na saúde.


Gustavo relata que a maioria das pessoas quando vai para acampamentos noturnos, dorme cedo e com mais facilidade. E que ele, como guia, induz o momento de apreciar o céu.

Ouvido pela reportagem, Daniel, assim como outros especialistas, apontam o impacto negativo da poluição luminosa no ciclo circadiano, também chamado relógio biológico.


Dentre as intenções do IASTRO e o que ele pode gerar de repercussão no astroturismo, estão as parcerias público privadas, possibilitando patrocínios para que sejam realizadas as certificações dos parques.

O astrônomo Daniel Mello, que também faz parte do projeto Astroturismo nos Parques Brasileiros, avalia que a ferramenta pode ser uma forma de canalizar a atenção e direcionar os esforços para o processo de certificar os parques com maior potencial.

Para Vitor Barbato, turismólogo e técnico ambiental do ICMBio Parna do Iguaçu, o ranking visa incentivar outras políticas públicas que tenham a ver com o astroturismo.

“Por exemplo, de manuais e diretrizes para gestores de áreas protegidas, para que saibam como fazer a implementação do astroturismo na unidade, para que saibam como funciona essa atividade e o que a gente precisa fazer para incentivar isso”, explica.

Dentro das unidades de conservação existe uma categoria especial, a de parques ou reservas de céu escuro.

No processo de busca sobre esse tema, Dennis e Letícia descobriram que além da existência de uma certificação para céus escuros, só há um parque estadual certificado no Brasil, o Parque Estadual do Desengano (RJ), que foi o primeiro da América Latina a ter essa autenticação pelo Dark Sky International.

Essa certificação também é feita pela Starlight Foundation. Com o IASTRO, foi possível concluir, de acordo com Dennis, que 35 parques brasileiros possuem um potencial maior que o Parque do Desengano, e com uma qualidade de céu melhor que o do parque localizado no estado do Rio de Janeiro.

Índice

Dennis, economista, e Letícia, psicóloga, são de São Paulo e quando começaram a expedição foram morar em um trailer e passavam muito tempo ao ar livre, em lugares muito escuros, e logo se encantaram com o céu e o que eram os astros.

Perguntavam: “será que eles se movimentam juntos, será que as estrelas vão estar numa outra posição quando a gente mudar de parque?”.

Com tantas questões, o casal foi atrás de informação de todos os parques sobre poluição luminosa, dados que podem ser encontrados no Light Pollution Map, mapa interativo da poluição luminosa no mundo.

Junto a isso, na base de dados do SNUC, obtiveram informações sobre todas as unidades de conservação, inclusive sobre a climatologia.

A partir de uma aproximação, ao combinar essas duas informações, eles criaram um ranking e ampliaram a equipe, que passou a contar com o astrofísico e astrônomo Daniel Mello e o turismólogo Vitor Barbato. Partindo de uma fórmula matemática, o IASTRO nasceu.

“O IASTRO abre a possibilidade de a gente começar a movimentar o astroturismo de uma forma mais perene, no Brasil. Com isso, abre a possibilidade de a gente trazer investimentos para o controle da poluição luminosa nas cidades e em torno dos parques”, diz Dennis.

Em termos de preservação do céu estrelado, Daniel aponta como algo extremamente importante que vai favorecer a capacitação de profissionais para começar a atuar no astroturismo, “oferecendo e incentivando o aumento da renda”, diz o astrônomo.

No Mapa Brasil IASTRO, elaborado pela reportagem, é possível ver os 75 parques nacionais e sua classificação em cores para o astroturismo. Os pinos verdes destacam os parques que são aqueles de potencial excelente para o astroturismo, os amarelos são os classificados como ótimos, os em azul são os muito bons, os pinos laranjas são os classificados como bons, e os em vermelho são aqueles com baixo potencial para o astroturismo.

Crédito: Fernanda Diniz. Fonte: IASTRO


Astroturismo nas regiões do Brasil


O levantamento feito pela reportagem com os dados apresentados no IASTRO mostram os parques nacionais brasileiros divididos por categoria, regiões do país e estado.

Com o levantamento, é possível observar que as regiões Nordeste e Norte são as que possuem o maior número de parques nas categorias de excelente, ótimo e muito bom para o astroturismo.

É válido relembrar que há parques multifronteira, que perpassam por mais de um estado, de modo que o total de parques excede aos 75 catalogados pelo SNUC, porque, afinal, aparecem mais de uma vez por estado e região.

No Nordeste, são sete parques classificados como excelentes e 10 parques que correspondem a ótimo na classificação; no Norte, são 2 parques excelentes e 9 parques classificados como ótimo.

As ilustrações elaboradas pela reportagem apontam quantos parques existem em cada estado e a classificação dos parques nas regiões Nordeste, Norte e Sul.

As imagens feitas pela reportagem são representativas das categorias e da quantidade de parques nos estados, e não a localização real georreferenciada deles.

O astrofísico e astrônomo Daniel Mello ressalta que um dos critérios de avaliação mais importantes é a qualidade do céu, com um peso de 50% na análise para o índice de astroturismo.

Essas regiões, conforme Daniel, não são muito impactadas pelas luzes artificiais. No Nordeste, por exemplo, a maioria das capitais está no litoral, o que significa que o interior desses estados ainda possui menor impacto da iluminação artificial.

Outro fator que também influencia no cálculo matemático da fórmula do IASTRO é o clima, tendo em vista que a chuva diminui o potencial astro turístico.

Em biomas como o da Caatinga e o do Cerrado, observa o astrônomo, eles correspondem a regiões com menos probabilidade de haver tempo ruim ao longo do ano.

A questão da poluição luminosa, que influencia na visibilidade do céu estrelado, é medida com a escala Bortle, que vai do 1 ao 8/9, em que o número 1 representa os melhores céus, com menor poluição luminosa e o último número, aquele com maior poluição luminosa, localizado geralmente no centro da cidade, explica o astrônomo Daniel.

Na extensão de um parque, pode haver pontos com diferentes valores na escala, mas na avaliação do ranking do IASTRO, o parque corresponde ao melhor número avaliado no local.

No IASTRO, a região Sul foi a que mais apresentou parques na categoria de potencial baixo para o astroturismo, com um total de três, em comparação às outras regiões que não pontuam ou apresentam apenas um parque nesta classificação.

Dennis explica que isso se deve ao peso dos critérios utilizados para análise, para o qual pontuam mais a poluição luminosa e a climatologia.

Os parques sulistas são caracterizados como de baixo potencial por estarem mais colados para o litoral do que para o interior, então, além do fator clima, eles ficam mais próximos das cidades e consequentemente da luminosidade.

Desse modo, mesmo considerando que os parques nordestinos e nortistas tenham uma infraestrutura menos desenvolvida, os outros tópicos avaliados fazem com o que o parque seja classificado como um lugar com maior potencial para o astroturismo, uma vez que a infraestrutura pode ser modificada, criada, mas a climatologia não permite modificações, segundo explicações da equipe do IASTRO.

Incentivo ao astroturismo


Além dos critérios já comentados, foram definidos mais dois critérios que viabilizam e incentivam diretamente o astroturismo. O primeiro critério é o condutor de visitante, que é um parceiro da unidade de conservação, e faz um credenciamento.

O analista ambiental Vitor Barbato esclarece que, com os condutores autorizados, a unidade de conservação tem a facilidade de adequar a visita ao horário de visitação especificamente para esses condutores, tendo em vista que parte do passeio é noturno.

O guia de turismo Gustavo Maia explica que o trabalho do guia em si é conduzir as pessoas com segurança, ter equipamentos especiais, conhecer bem o local, ter pontos estratégicos para tudo, “você gera uma experiência para a pessoa”.

O outro critério utilizado foi o da infraestrutura de pernoite, que viabiliza o acesso à unidade de conservação. Ele abrange pousada ou camping dentro da unidade, camping rústico, que seria o lugar que não conta com uma infraestrutura, mas está definido operacionalmente, e a pousada ou camping no limite da unidade.

Esses três recebem notas diferentes dentro desse parâmetro. Há também os parques com hotel ou camping próximo, que recebem a segunda menor nota da classificação, e os parques sem infraestrutura de pernoite próxima a unidade, que recebem nota zero.

Os critérios de infraestrutura turística foram discutidos pela equipe e estão relacionados principalmente com o documento do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), chamado Rol de Oportunidades de Visitação em Unidades de Conservação, que trata sobre como oportunizar diferentes acessos às unidades.

Caminhos da reportagem de Dados

A reportagem começou com o lançamento do IASTRO, classificando os 75 parques nacionais e o seu potencial para o astroturismo, usando critérios relacionados a qualidade do céu, climatologia e infraestrutura.

A partir da análise da quantidade de parques com determinada classificação por região, a repórter percebeu a existência de regiões do Brasil mais privilegiadas no âmbito de potencial para essa atividade e trouxe esse questionamento para a pauta da reportagem e a relação com a possível certificação dos parques.

Foram, então, realizadas entrevistas com a equipe do IASTRO, Dennis Hyde, um dos idealizadores do projeto, os especialistas, Daniel Mello, astrônomo e astrofísico, e Vitor Barbato, turismólogo e técnico ambiental do ICMBio Parna do Iguaçu. Além da equipe do IASTRO, o guia turístico, Gustavo Maia, atuante na Chapada dos Veadeiros (GO), também foi entrevistado.

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