Spcine completa dez anos e quer expandir salas e dar resposta à crise do cinema

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LEONARDO SANCHEZ
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Criada em 2015 quando Fernando Haddad ocupava a Prefeitura de São Paulo, a Spcine completa dez anos nesta semana sob uma gestão ideologicamente oposta àquela do petista, ainda na ressaca da eleição do emedebista Ricardo Nunes.

Mesmo que alas do atual governo tentem colar à empresa estatal a pecha de “esquerdista”, segundo fontes ouvidas pela reportagem, a Spcine foi abraçada por todos aqueles que ocuparam o cargo desde Haddad, e segue ampliando e diversificando seus programas de apoio ao audiovisual.

“No Brasil a gente sofre muito com a lógica de descontinuidade na gestão pública, a cada gestão muita coisa muda. Mas a Spcine nasceu já pensando no diálogo, foi amadurecendo com o tempo, e as diretorias sempre tiveram um compromisso com a continuidade das ações”, diz Lyara Oliveira, que em fevereiro completa um ano como presidente da empresa.

“Trabalhamos de forma pragmática, mostrando resultados. Às vezes temos boas ideias, programas incríveis, mas de nada adiantam se os resultados não são mensurados”, emendando que uma das prioridades neste encerramento de década são mapeamentos e levantamentos conduzidos pelo Observatório, braço de pesquisa da Spcine.

“O cinema não tem uma bússola de direita ou esquerda. A forma como a empresa vem trabalhando fez com que ela se consolidasse, que dispensasse brigas”, diz Emiliano Zapata, diretor de inovação e políticas audiovisuais.

Entre os resultados apresentados neste aniversário estão o fomento a 7.604 obras audiovisuais e o uso da cidade de São Paulo como locação para 22.391. Na ponta da exibição, a Spcine contabiliza 2,3 milhões de espectadores em seu circuito de salas públicas, referência na América Latina.

Acordos de cooperação internacional e prêmios a filmes e séries que receberam seu apoio, como “Baby”, de Marcelo Caetano, e “Cidade; Campo”, de Juliana Rojas, também estão no balanço da empresa, que opera em toda a cadeia do audiovisual paulistano, fomentando, divulgando e exibindo obras locais e também atraindo produções de fora para filmar e investir aqui.

Este é um dos principais desafios da Spcine hoje. Oliveira acredita que São Paulo está atrás, mas não atrasada em relação a outros destinos populares da indústria audiovisual. Cidade do México e Bogotá, por exemplo, são cenários muito mais frequentes em filmes e séries estrangeiros, bem como Montevidéu.

Seus programas de “cash rebate” -um sistema de incentivo que usa reembolsos para produtoras que queiram filmar em determinada cidade ou país-, são mais longevos, afirma. São Paulo, ao caminhar para seu terceiro chamamento do tipo, busca passar essa mesma imagem de estabilidade.

“O planejamento das produções estrangeiras é mais longo. Se planeja em 2025, para captar dinheiro em 2026 e começar a filmar em 2027. Como explicar para as produtoras que o nosso planejamento financeiro é anual? Montevidéu já tem essa reputação de que o ‘cash rebate’ vai continuar existindo, independente de mudanças no país”, diz ela. Oliveira cita, a favor da capital paulista, a diversidade de paisagens, a boa infraestrutura e a mão de obra disponível.

Para os próximos meses, duas produções de grande porte da South, produtora de Alice Braga e Bianca Comparato, miram São Paulo como cenário, segundo apurou a reportagem. Os projetos, com detalhes mantidos em sigilo, são ficções científicas carregadas de efeitos especiais e com ares de distopia.

Estes e outros assuntos estarão em foco no Fórum Spcine, que tem como tema Passado, Presente e Futuro e que reunirá, em junho, na Cinemateca Brasileira, atividades, painéis, grupos de trabalho e oficinas, para conceber uma agenda de prioridades para guiar o setor, cambaleante desde a Covid-19.

A avaliação da empresa é que o cinema precisa entender seu papel num mundo profundamente transformado pela pandemia. Lembra, porém, que a demanda por audiovisual só cresceu desde então, e que o modelo de salas não deve morrer, mas passar por uma transformação natural.

Tanto que o circuito de salas públicas da Spcine, montadas especialmente em CEUs da cidade, localizados em áreas historicamente desassistidas de equipamentos culturais, tem crescido. Os números ainda estão abaixo da era pré-Covid -471.246 em 2019 versus 227.371 em 2024-, mas uma das prioridades deste ano é continuar ampliando seu alcance.

Para os próximos meses, o objetivo é inaugurar 15 espaços do tipo, em adição aos 32 já existentes. À frente do planejamento, Zapata afirma que ir ao cinema, hoje, é uma experiência cara e que muitas famílias não conseguem incluí-la em seu orçamento. Quando podem, porém, não a veem como prioridade.

“A gente precisa formar público. E não falo só de crianças, há muitos idosos nas periferias que nunca foram. Hoje, essas pessoas vão a uma sala pública do CEU, mas amanhã ela pode transformar a ida ao cinema em prioridade, separar um valor do orçamento para isso. Todo o sistema se beneficia”, diz ele, que cresceu em São Miguel Paulista, bairro da zona leste que hoje é servido apenas por uma sala de cinema, da Spcine.

Entre os próximos planos estão ainda a ampliação do Circuito Azul, com sessões destinadas a autistas, e a criação de programas voltados ao público com mais de 60 anos, a mães gestantes ou com crianças pequenas e a quem queira ir acompanhado de animais de estimação. Uma parceria com a Fundação Casa, para levar filmes e oficinas à instituição, e o Festival Audiovisual, um ‘Lollapalooza de filmes'”, como descreve, ampliam a lista.

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