Protesto contra a extrema direita leva 160 mil às ruas de Berlim

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JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS)

“Nein, Friedrich”, dizia de forma direta o cartaz. Em um fim de semana de protestos na Alemanha, o alvo preferido dos manifestantes foi Friedrich Merz, o candidato conservador que lidera as pesquisas e tentou aprovar um projeto de lei com a ajuda da extrema direita. Neste domingo (2), cerca de 160 mil pessoas foram às ruas de Berlim para criticar o político e defender o isolamento institucional da AfD, a sigla de ultradireita do país.

Foi uma das maiores demonstrações populares na capital federal nos últimos anos, a três semanas das eleições parlamentares.

No sábado (1º), manifestações nas principais cidades do país já haviam reunido mais de 80 mil pessoas, também de acordo com estimativas oficiais. Em Berlim, segundo os organizadores, foram 250 mil. A polícia admitiu que a contagem era complexa, já que vários protestos ocorreram ao mesmo tempo. Todos saíram das cercanias do Parlamento, no centro da cidade, para a sede da CDU, a União Democrática-Cristã, partido de Merz.

A caravana, acompanhada por mais de 500 policiais, começou a ser retida quarteirões antes do endereço da legenda, pois “há muita gente na rua”, repetia um porta-voz da polícia, com um megafone, efusivamente aplaudido toda vez que confirmava o tamanho da multidão. A expectativa inicial era de 60.000 participantes.

Próximo à Konrad Adenauer Haus, edifício da CDU que leva o nome de um dos maiores políticos do pós-guerra alemão, os discursos sublinhavam que Merz não estava à altura da história do partido conservador. Na semana passada, o político foi criticado inclusive pela Igreja Evangélica, dominante no país, por tentar aprovar uma legislação linha-dura de controle imigratório.

Para tanto, Merz admitiu repetir estratégia que já havia usado na quarta-feira (29) ao aprovar uma moção sobre o mesmo assunto: contar com votos da AfD. Na Alemanha, a sigla extremista vive ou vivia um isolamento institucional estabelecido pelo campo democrático. Merz, que alegou urgência para tratar do tema após episódios de violência provocados por imigrantes, foi criticado até por colegas de partido, como a ex-premiê, Angela Merkel.

“Nós somos o Brandmauer”, inclusive, foi o mote da manifestação em Berlim. O termo alemão para firewall designa justamente a distância que a maioria dos políticos e setores ativos da sociedade civil exigem que seja mantida da AfD. A sigla, criada em 2013 para defender a saída da Alemanha da zona do euro, se radicalizou com a incorporação de extremistas. Parte de seus integrantes é investigada por discurso de ódio e neonazismo.

Na atual campanha, conta com o impulso dado pela onda de populismo na Europa e o apoio digital de Elon Musk.

Merz e aliados passaram o fim de semana afirmando que fizeram a coisa certa ao tentar aprovar a legislação e que os votos da AfD eram um efeito colateral aceitável. Avaliações internas da CDU, segundo a imprensa alemã, detectaram aprovação à estratégia. Pesquisa publicada na sexta-feira (31) pelo jornal Bild mostrava que cerca de 70% dos ouvidos concordavam com a necessidade de um controle imigratório mais rígido.

Em Berlim, o público que protestava era absolutamente outro. Inúmeros trocadilhos com o nome de Merz dominavam os cartazes, sendo que um dos mais leves falava em “schMerz”, dor em alemão. Gritos de ordem como “nazistas fora”, “fascismo nunca mais” e “vergonha de você, CDU” conviviam com tiradas mais bem-humoradas, como “porque eu adoro kebab” e “Friedrich, ouça a mamãe”, em referência a Merkel.

Também participaram da manifestação alguns políticos, como Robert Habeck, candidato dos Verdes a primeiro-ministro, e Michael Friedman, um conhecido jornalista, judeu, que anunciou sua saída da CDU na semana passada depois que Merz usou os votos da AfD. “Estamos aqui porque somos contra o racismo e o antissemitismo”, afirmou em discurso, ponderando que a questão não era a CDU -apesar do “erro imperdoável, um partido democrata”.

O problema, afirmou Friedman, é a AfD, que está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto. “É hora de pararmos de reagir e começarmos a agir.”

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