Uma nova norma no transporte marítimo pode contribuir para acelerar o aquecimento global

O novo recorde de calor alcançado em janeiro surpreendeu os cientistas e alguns deles explicam esta situação pela entrada em vigor, em 2020, de uma norma que reduz as emissões de óxido de enxofre no transporte marítimo.

– O que diz a norma? –

Desde 1º de janeiro de 2020, os porta-contêineres, graneleiros e petroleiros que navegam pelos oceanos devem usar um combustível que não tenha um conteúdo em enxofre superior na 0,5%, frente ao 3,5% anterior.

Já existiam restrições ainda mais estritas em algumas das chamadas “Zonas de Controle de Emissões” do mar Báltico,  mar do Norte, a zona americana e a zona marítima do Caribe dos Estados Unidos.

O regulamento foi adotado pela Organização Marítima Internacional (OMI), uma instituição da ONU que se ocupa das questões marítimas e da regulação do setor.

Os aerossóis de enxofre são responsáveis por muitos problemas de saúde, como derrames cerebrais, doenças pulmonares e cardiovasculares.

– O que mudou com a nova norma? –

As emissões de óxido de enxofre (SOx) diminuíram em 7,4 milhões de toneladas métricas em 2020 em comparação com 2019, segundo um artigo da revista Earth System Science Data, de junho de 2024.

Este número está muito próximo da meta da OMI de 8,5 milhões de toneladas métricas de SOx, representando uma redução de 77% nas emissões do setor marítimo.

Segundo a agência da ONU, apenas duas embarcações com teor de enxofre superior a 0,5% no combustível foram inspecionadas em 2023. Desde que os novos regulamentos entraram em vigor, apenas 67 infrações foram registradas.

– A nova norma promoveu o aquecimento global? –

As emissões de óxido de enxofre são classificadas como aerossóis. Não são gases de efeito estufa que contribuem para o aquecimento global. Ao contrário, os aerossóis de enxofre ajudam a criar nuvens que refletem parte do calor do sol.

A queda nas emissões pode ter desempenhado um papel na multiplicação dos recordes de calor nos últimos meses. No entanto, “não somos capazes de quantificá-la com muita precisão”, disse Olivier Boucher, diretor de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS).

“Vários artigos mostram que há uma mudança detectável nas propriedades ópticas das nuvens sobre as rotas marítimas”, acrescentou o pesquisador.

Em resumo, as nuvens sobre os mares e oceanos mudaram desde 2020 e agora são compostas por gotículas muito mais espessas e, portanto, menos refletivas.

A redução das emissões de óxido de enxofre do transporte marítimo “contribui um pouco” para o aquecimento global, “mas não estamos em posição de dizer que contribui muito”, disse Boucher.

Segundo um artigo científico publicado em agosto na Earth’s Future, a norma introduzida pela OMI deverá causar um aumento estimado de 0,05°C na temperatura da superfície global até 2029.

A redução drástica nas emissões de óxido de enxofre “ajuda a explicar o calor excepcional de 2023, mas outros parâmetros devem ser levados em consideração”, argumentou o estudo.

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© Agence France-Presse

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