Múcio diz que precisou da ajuda de Bolsonaro para diálogo com militares e declaração pode ser usada na defesa do ex-presidente

O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, revelou em entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura, nesta segunda-feira (10), que precisou recorrer ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para conseguir ser recebido pelos comandantes das Forças Armadas durante o período de transição do governo, após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais de 2022. 

Ao assumir o comando do Ministério da Defesa, Múcio encontrou resistência dos chefes militares da época: o general Marco Antonio Freire Gomes (Exército), o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior (Aeronáutica) e o almirante Almir Garnier Santos (Marinha). “Minha primeira dificuldade foi ser recebido pelos comandantes. Foi quando eu recorri ao presidente Bolsonaro, que estava em Brasília. Foi meu colega de muitos anos”, contou o ministro, lembrando o período em que ambos atuaram juntos no Congresso Nacional.

Múcio relatou que, após seu pedido, Bolsonaro fez contato direto com os chefes das Forças Armadas, facilitando as conversas com os comandantes do Exército e da Aeronáutica. No entanto, o almirante Garnier Santos se recusou a recebê-lo. “Mas teve uma coisa curiosa. Ele [Garnier Santos] não foi passar o cargo, a posse foi entre 10h e 11h, mas ele foi para o nosso almoço, com todo mundo junto. Foi uma coisa, acho, mais por birra política. Não me recebeu em hipótese nenhuma”, relatou o ministro.

A resistência do almirante Garnier é especialmente significativa, uma vez que ele está entre os indiciados pela Polícia Federal por suposta participação em uma trama golpista após o resultado das eleições. Segundo as investigações, Garnier teria demonstrado uma postura diferente de seus colegas de comando durante reuniões em que Bolsonaro teria discutido a possibilidade de um golpe de Estado.

Durante a entrevista, Múcio também abordou o papel das Forças Armadas nos eventos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas por manifestantes golpistas. O ministro defendeu que os militares foram fundamentais para evitar que o golpe se concretizasse. “O início foi péssimo. Do dia 8 até abril, eu me senti órfão, porque a direita estava zangadíssima porque os militares não aderiram ao golpe, e a esquerda muito zangada porque achava que os militares tinham criado aquele golpe. Na realidade, nós devemos a eles não termos tido o golpe do dia 8”, afirmou.

Múcio, no entanto, destacou a necessidade de dosimetria nas penas aplicadas aos envolvidos nos atos golpistas. “Sempre defendi que devia ter uma dosimetria. Tem gente que quebrou uma cadeira e tem gente que armou esse movimento. Se for tudo comprovado, que este (que armou), se foi um golpe, pague. Agora, aqueles que tomaram seus ônibus, estavam lá tirando foto de celular… tem os que entraram quebrando, os que ficaram do lado de fora. Tem de todo tipo”, disse o ministro. Ele enfatizou que a decisão final sobre o tema cabe ao Congresso Nacional, que discute atualmente a possibilidade de anistia para alguns dos condenados.

Ao ser questionado sobre sua permanência no governo, Múcio revelou que já havia sinalizado ao presidente Lula a intenção de deixar o cargo no final de 2024. No entanto, segundo ele, o presidente insistiu para que continuasse, afirmando que o momento ainda exigia estabilidade na pasta da Defesa. “Ele (Lula) disse: ‘Olha, Múcio, nós estamos em uma fase difícil, somos amigos, sei das suas pretensões, quer estar à disposição da família, dos amigos, mas quero que você fique. Estamos com alguns desafios e não queria abrir mais um problema. E os comandantes militares também não querem’. E ele pediu para que eu ficasse e, pedido de amigo…”, explicou o ministro, que desconversou quando perguntado se permanecerá até o final do mandato. “Isso é outra história. Vamos atravessar o ano primeiro”, disse em tom descontraído.

O ministro também comentou um episódio recente envolvendo a Marinha. Em dezembro de 2024, a instituição publicou um vídeo institucional em celebração ao Dia do Marinheiro, no qual ironizava cortes no orçamento das Forças Armadas, questionando se a vida militar tinha “privilégios”. Múcio classificou o vídeo como uma “imprudência”. “Aquele vídeo foi uma imprudência. Inoportuno. Foi num momento péssimo”, afirmou. Após o incidente, o ministro levou o comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, para uma conversa com o presidente Lula. Segundo Múcio, Olsen reconheceu o erro durante o encontro.

O atual cenário político das Forças Armadas também foi tema da entrevista. Múcio destacou que, apesar das tensões iniciais, a relação entre o governo e os militares tem se estabilizado. O ministro acredita que a fase mais complicada já foi superada, mas reconhece que desafios ainda persistem, especialmente na reconstrução da confiança entre as instituições e a sociedade.

Defesa de Bolsonaro afirmou que irá se aproveitar de falas de Múcio 

A entrevista do ministro da Defesa repercutiu além das expectativas iniciais, especialmente entre aliados e membros do núcleo jurídico do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A declaração de Múcio, na qual revelou ter solicitado ajuda de Bolsonaro para ser recebido pelos comandantes das Forças Armadas durante a transição de governo, foi rapidamente interpretada como uma evidência favorável ao ex-mandatário.

O advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, não perdeu tempo e confirmou ao G1 que usará essas declarações no inquérito que investiga uma suposta trama golpista. “É, obviamente, incompatível a intenção de dar um golpe e determinar a transmissão do comando militar”, afirmou Vilardi, destacando que a intervenção do ex-presidente seria prova de sua disposição em garantir a normalidade institucional.

Agora, com a entrevista de Múcio servindo como nova munição, os aliados de Bolsonaro veem a oportunidade de reforçar essa narrativa. Trechos da fala do ministro estão sendo destacados e utilizados tanto no campo político quanto jurídico, numa tentativa de afastar as acusações que pairam sobre o ex-presidente. A defesa pretende explorar ao máximo o fato de que Bolsonaro não apenas facilitou a transição de governo, mas também agiu, segundo Múcio, para garantir que ela ocorresse de maneira pacífica e organizada. 

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