Pontes para o Consensualismo

A sociedade contemporânea está passando por profundas mudanças, impulsionadas pela revolução digital e pela globalização. Nesse contexto, a Administração Pública tradicional, marcada por ações demoradas, burocracia e judicialização intensa, tornou-se incompatível com a presteza reclamada pelo cidadão do século XXI.Por outro lado, espalham-se por todo Brasil parcerias entre o Poder Público e a iniciativa privada, por meio de contratos de concessão de longo prazo, muito complexos, e que miram investimentos de interesse coletivo, a despeito desse histórico engessamento no relacionamento público-privado.

Diante disso, a legislação tem evoluído para oferecer aos gestores opções ágeis, permitindo que obras e serviços concedidos, e que estejam em crise contratual, sejam retomados por meio de técnicas de mediação. A Lei Federal nº 13.655/2018, o Código de Processo Civil e o Decreto Federal nº 9.830/2019 estabelecem as bases para o consensualismo, indicando, inclusive, que as instâncias de controle devem se pautar nesse sentido.Assim, as Cortes de Contas, órgãos de controle por excelência, podem e devem ser protagonistas do consensualismo, de modo a intermediar impasses entre entes públicos e privados. Atento a essa contemporaneidade, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) expediu a Resolução 46/2024, a qual regrou um procedimento de solução breve e eficaz de conflitos, liderado pela Casa de Contas.Essa orientação é coerente com os valores que adotei quando assumi a presidência do Tribunal de Contas, pois sempre defendi que o TCE deveria ter um perfil mais educativo e orientador, priorizando ações que acautelem o interesse público, sem deixar de punir os malfeitores.A Comissão Consensual de Controvérsias e Prevenção de Conflitos lidou com o primeiro caso submetido à mediação, o sistema da Ponte Salvador/Itaparica, a qual ainda não teve início efetivo devido às distorções dos custos provocadas pela epidemia da Covid.As partes envolvidas, após quatro anos de tentativas frustradas, somente chegaram a um acordo diante da mesa de mediação do TCE, logrando ajustes contratuais que dão segurança aos investimentos programados, com ganhos para o Estado e para a população.A proposta, a qual foi validada pelo colégio de conselheiros, condensou uma solução que foi considerada, pelos nossos auditores e pelo Ministério Público de Contas, como equilibrada, motivada e dentro da legalidade, preservando o interesse público e a vantajosidade para o Estado.O esforço criou as condições para encorajar os gestores a retomar os investimentos, sem prejuízo de o TCE permanecer vigilante durante as esperadas construção e operação do projeto, com o rigor e a transparência costumeiros, dentro de sua competência legal.*Marcus Presídio é Presidente do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE)

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