Governo brasileiro tentará reverter tarifaço de Trump em um mês

ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A decisão do governo brasileiro de evitar qualquer conflito com o presidente americano Donald Trump sobre o tarifaço anunciado sobre o aço e o alumínio passa por um prazo de negociação, já calculado pelo Palácio do Planalto, para tentar reverter a situação.


As tarifas de 25% sobre as importações de aço e alumínio impostas pelo presidente dos EUA entrarão em vigor em 12 de março de 2025, ou seja, daqui a um mês.


A cúpula do governo brasileiro acredita que esse tempo será suficiente para que, por meio de suas representações diplomáticas, seja encontrada uma alternativa para manter o cenário de cotas de exportação que está em vigor desde 2018, isentando o Brasil da cobrança extra.


Essa decisão está pactuada com as entidades de classe empresarial, que agora darão início à fase de negociações, apoiadas pela representação oficial do governo. Por isso, o momento é de cautela e de busca da via diplomática para tentar resolver a situação, evitando movimentos que afetem a indústria nacional ou que levem a uma guerra comercial entre os países.


Um integrante do alto escalão do governo apontou, em comentários feitos sob reserva, que Trump já anunciou várias decisões neste mandato para, no momento seguinte, rever sua posição. Esse mesmo auxiliar de Lula destacou que as medidas tomadas pelo americano afetam vários países, o que encoraja os brasileiros a buscarem diálogo.


A visão é que Trump “reage mal ao enfrentamento”, nas palavras de um ministro, que recomenda cautela e o exercício da diplomacia.


Nesta terça-feira (11), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu declarações no mesmo sentido, reforçando que a decisão dos Estados Unidos é “genérica, para todo mundo”. Haddad afirmou, porém, que “medidas unilaterais desse tipo são contraproducentes para a melhoria da economia global”.


Os movimentos do governo brasileiro são calculados com as principais empresas do setor, que têm evitado dar declarações pontuais sobre o cenário e centralizam o posicionamento em suas associações.

Dez companhias procuradas pela reportagem nos dois últimos dias informaram que preferiam não se manifestar sobre o assunto até que o quadro geral fique mais claro.


A Abal (Associação Brasileira do Alumínio) declarou que “manifesta preocupação com os impactos da nova medida tarifária”, que não inclui exceções ou isenções para nenhum país. Embora a participação do Brasil nas importações americanas de alumínio seja relativamente pequena, chegando a menos de 1%, os Estados Unidos são um parceiro comercial importante e respondem por 16,8% das exportações brasileiras do metal, segundo a associação.


O mercado americano movimentou US$ 267 milhões do total de US$ 1,5 bilhão exportados pelo setor em 2024. Em termos de volume, os Estados Unidos foram o destino de 13,5% do total (72,4 mil toneladas) das exportações brasileiras de alumínio.


“Cenários desafiadores como este requerem sensibilidade e diálogo na construção de soluções que não são simples, mas que levem em consideração a necessidade de evitar disrupturas no suprimento de produtos e materiais estratégicos para a economia brasileira”, afirmou a associação, acrescentando que “está em diálogo com o governo brasileiro para compreender as implicações dessa medida e buscar soluções que mitiguem seus impactos sobre a economia nacional no curto e médio prazo”.


O Instituto Aço Brasil, que representa as siderúrgicas brasileiras, disse que recebeu “com surpresa” o anúncio de Donald Trump e negou o argumento usado pelo presidente americano, de que o Brasil estaria importando grandes quantidades de aço chinês para enviar a produção nacional para os Estados Unidos. Esse argumento foi apresentado em um documento assinado por Trump e publicado na segunda.


Como mostrou a Folha de S.Paulo, a decisão de Trump tem, como efeito colateral, a redução do carvão metalúrgico comprado pelo Brasil dos próprios americanos. O insumo é utilizado para produzir boa parte do aço brasileiro que, posteriormente, é vendido para os americanos.


O carvão metalúrgico, também conhecido como carvão coqueificável, é um combustível essencial para o processo de produção de aço realizado pelos altos-fornos das siderúrgicas. O Brasil tem uma produção ínfima desse material e importa a maior parte.


Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços mostram que, só no ano passado, foram gastos US$ 1,4 bilhão com importações desse produto dos Estados Unidos para o Brasil. Nos últimos cinco anos, foram mais de US$ 6,2 bilhões colocados na compra desse insumo.


Paralelamente, a intenção de Trump de proteger os fabricantes americanos de aço e alumínio terão efeito direto sobre o preço dos produtos que dependem desses itens. Ao taxar os materiais importados que são vendidos mais baratos, a tendência natural é que o preço de produtos finais – como eletrodomésticos, máquinas e carros – subam e reflitam no bolso do consumidor dos Estados Unidos.


Até 2018, as importações de aço e alumínio pelos Estados Unidos seguiam regras mais abertas, com menores barreiras tarifárias, seguindo as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).


Dessa forma, Brasil e outros países exportavam aço para os Estados Unidos sem restrições significativas, além das normas antidumping ou medidas de defesa comercial específicas.


Em março de 2018, porém, em seu primeiro mandato, Trump anunciou tarifas de 25% sobre importações de aço e 10% sobre alumínio, baseadas na “Seção 232” do Trade Expansion Act, de 1962, o qual permite ao presidente impor tarifas quando um produto importado ameaça a segurança nacional dos Estados Unidos.


De início, essa medida afetava todos os países, mas o Brasil, Argentina e Coreia do Sul, por exemplo, conseguiram acordos para evitar a tarifa cheia. O Brasil aceitou cotas de exportação, limitando os volumes de aço exportados, sem tarifas extras. Essas regras foram mantidas pelo governo Joe Biden, mas, agora, revisadas novamente por Trump.


Naquela ocasião, os governos de Estados Unidos e Brasil negociaram o estabelecimento de cotas de exportação de 3,5 milhões de toneladas de semiacabados e placas e 687 mil toneladas de laminados. A medida flexibilizou a decisão que havia estabelecido alíquota de importação de aço para 25%.


Os Estados Unidos importaram, em 2024, 5,6 milhões de toneladas de placas, por não dispor de oferta suficiente para a demanda do produto em seu mercado interno, das quais 3,4 milhões de toneladas vieram do Brasil, segundo informações do Instituto Aço Brasil. “As exportações brasileiras de produtos de aço para os Estados Unidos cumpriram integralmente as condições estabelecidas no regime de ‘hard quota’, não ultrapassando, em momento algum, os volumes estabelecidos tanto para semiacabados como para produtos laminados”, declarou o instituto.

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