Minha Casa, Minha Vida: taxação do aço pode encarecer moradias populares

“Sem exceções ou isenções”: é essa a única ressalva da medida que determina a taxação à exportação de aço e alumínio pelos Estados Unidos ao Brasil. Se concretizada, toda e qualquer entrada do produto brasileiro em território estadunidense será tarifada em 25%.A medida apesar de ser recebida com cautela, já que os EUA é um grande parceiro comercial do Brasil – o maior comprador de aço brasileiro -, é entendida por especialistas como uma pressão ao governo por sua relação também comercial com a China.Especialistas no cenário internacional apontam que o maior impacto com a medida estadunidense seja o aumento do desemprego no Brasil, devido a queda na produção e nas vendas do aço ao grande parceiro comercial.“Se a gente perde um parceiro comercial importante, podemos gerar um impacto significativo nessa indústria, gerando desemprego, alocação ineficiente de recursos, uma economia que eventualmente vai crescer menos”, disse a professora de economia da Insper, Juliana Inhasz.A economia enfraquecida significa um impacto também em toda a cadeia produtiva do setor, além de ramos importantes da economia brasileira, como a construção civil. “A construção civil é um setor que querendo ou não, gera um impacto importante e significativo no PIB. Com a taxação isso pode ter um revés considerável. Há uma possibilidade de um problema que se espalha por várias cadeias produtivas, por setores. Então, convém perceber como isso se desdobra ao longo do tempo”, continua ela.

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EncarecimentoA especialista disse que a tendência é de que haja uma sobra do produto na economia nacional. Entretanto, isso não é atrativo e muito menos viável para um país cujo maior consumo de produtos brasileiro, como o aço e alumínio, acontece por meio da exportação com os EUA. A expectativa é de que o país aceite a taxação, mas futuramente repasse de custos para a economia doméstica, havendo um encarecimento do produto.“Com menos mercado lá fora, quem é que vai querer produzir para ficar com aço sobrando? Não necessariamente o impacto em preços é tão depressivo como muita gente acha. Acredito que os preços podem não mexer muito porque a gente tem um mercado bem mais restrito que vai fazer o que vai acabar instigando uma oferta mais restrita e sob uma condição de comercialização que não é favorável a essa cadeia produtiva”, concluiu.

“Acho que a gente vai continuar vendendo para eles. A gente vai ter que abaixar a cabeça e aceitar a tributação e no final das contas receber menos por esse produto, A cadeia produtiva vai ficar pressionada e aí o que os produtores podem tentar fazer é repassar os custo dessa medida para o produto interno. Se isso acontecer, é um cenário ruim para a gente, porque o produto não só não fica mais barato porque eles vão tentar aproveitar a comercialização lá fora. Se isso acontecer, a demanda aqui sobe e eles vão repassar uma parte das perdas para o preço doméstico

Juliana Ianhsz, economista

Moradias sociais mais carasCom o repasse para o setor de construção civil, a especialista acredita que é possível que haja uma alta no preço do aço – um bem insubstituível – devido à redução da produção. Isso pode fazer com que o preço das moradias do Minha Casa, Minha Vida fique mais caro.“Em um outro cenário, o que vai acontecer é que a gente vai ter uma economia muito mais articulada, de entender que se o preço lá fora não favorecer, mas que mesmo assim é um mercado importante, continua produzindo e vendendo, mas repassando uma parte do custo aqui. Se isso acontecer, a indústria vai sofrer com preços maiores, então moradias de programas como Minha Casa, Minha Vida e qualquer coisa da construção civil vão ficar mais caras”, continua Juliana Inhasz.Lei da ReciprocidadeO governo brasileiro trabalha agora com a hipótese de, além de buscar outros parceiros comerciais para fortalecer a balança comercial brasileira, ainda usar a lei da reciprocidade, que também impõe as taxas de produtos estadunidenses consumidos pelo Brasil. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reafirmou nesta sexta-feira, 14, que deve reagir com a medida de taxação proposta em mais um mandado de Donald Trump.”Eu ouvi dizer que vai taxar o aço brasileiro. Se taxar o aço brasileiro, nós vamos reagir comercialmente, ou vamos denunciar na Organização do Comércio [OMC] ou vamos taxar os produtos que a gente importa deles”, afirmou Lula.Essa reação, entretanto, não faz muito sentido para especialistas ouvidos pelo Portal A TARDE. A doutora em economia Juliana Inhasz aponta que a reciprocidade é usada por países com características parecidas e que possuem impactos semelhantes e que, havendo essa resposta não haverá incentivo para os Estados Unidos visto a potência econômica que o país têm.“O Brasil não é Estados Unidos, e muito dificilmente um dia seremos. Então, reciprocidade nesse caso é algo meio estranho. Qual o incentivo que a economia americana tem para embarcar numa ideia de reciprocidade? Os EUA estão buscando um caminho que seja vantajoso para eles, estão tentando recuperar o seu espaço comercial. Então, por que eles iriam querer reciprocidade, se nós dependemos mais deles do que eles dependem da gente? Se a gente perder mercado lá, a gente que se dá mal”, disse ela.SoluçõesJuliana acredita ainda que o país deva tentar negociar uma forma de amenizar os efeitos tarifários, sem que haja uma reação drástica e sem efeitos. “Eu acho que uma conversa diplomática pode diminuir um pouco o impacto ou a percepção de algumas coisas. Mas, a partir daí, outras medidas precisam ser pensadas, porque eu acho que só essa não vai dar conta”, finaliza a professora.Ainda assim, economistas acreditam que o anúncio de Trump seja uma tentativa protecionista de favorecer o mercado de aço dos Estados Unidos ao encarecer o produto comprado no exterior, mas que isso seja apenas uma pressão comercial porque a taxação vai afetar principalmente os Estados Unidos.“Com a medida protecionista é o próprio EUA que sofrerá com um aumento de custo imediato e consequente inflação”, continua Daniela Cardoso, professora de Pós Graduação da Fundação Escola de Sociologia e Política.

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