Não te amo

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O taxista Travis Bickle vinha paquerando de longe Betsy, que trabalha em uma campanha eleitoral. Ela mal sabe que ele existe. Um dia, Travis entra no comitê e avisa que quer se voluntariar na campanha – mas para ela, não para outro funcionário que acompanha a conversa e decerto lhe daria um formulário para preencher. Betsy pergunta porque seria somente com ela. Ele responde: porque acha que ela é a mulher mais linda que ele já viu.

Ela abaixa os olhos, agradece e deriva a conversa para política, indaga o que ele pensa sobre as propostas do candidato, que era do Partido Democrata. Travis tartamudeia qualquer coisa, não conhece bem, não tem tanta certeza, busca recolocar a palestra nos trilhos da paquera. Se ele cravasse o olhar no decote dela só não seria pior se revelasse que costumava votava no Partido Republicano.

“Si et in quantum”, Travis só tem uma razão real para chamar Betsy para sair: sua beleza física. Ele nada mais sabe sobre ela, idade, gostos, valores, formação, projetos, família, nada; talvez ela fosse casada, com 2 filhos pequenos e 0 interesse em se entregar ao primeiro chofer de praça que aparecesse. Quando ele admite que sua pretensão é convidá-la para um café, ela novamente indaga o motivo. Então ele dá uma resposta abstrusa: ela parece ser uma pessoa solitária e infeliz, que “precisa de algo”, talvez um amigo como ele.

Ela hesita, demora para responder. O que possuía de dados também era demasiado exíguo: o aspecto de Travis, profissão, nacionalidade e, talvez pelo sotaque, naturalidade. Mas homens e mulheres são diferentes e um detalhe sutil poderia fazer a diferença, o cabelo, a voz, as mãos, o perfume, a ousadia. O senso de humor: ela dá uma risadinha quando ele fala que a protegerá, e até faz muque. Quanta distância há entre o querer, o gostar e o amar. “Eu te amo” é a frase mais abusada que existe.

Ivaldo Lemos Junior, procurador de justiça do MPDFT

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