Em 1 mês, Trump tenta ampliar poderes executivos ao desafiar leis nos EUA

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JULIA CHAIB
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS)

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, completa um mês à frente do cargo nesta quinta-feira (20) com um pacote de decretos que desafiam as leis americanas e que têm o objetivo de ampliar o poder do chefe do Executivo.

Trump assinou em um mês mais decretos do que qualquer outro ocupante da Casa Branca no período. Foram 115 até esta quarta-feira (19), mais que o triplo do que ele publicou os cem primeiros dias de sua passagem anterior pela Presidência, em 2017.

O republicano tem se debruçado e atuado em praticamente todas as áreas do governo. Seus atos passam por mudança das políticas de imigração, bloqueio do uso de verbas já autorizado pelo Congresso e até promoção da volta do canudo de plástico aos escritórios federais.

Alguns desses decretos foram bloqueados temporariamente pela Justiça, algo que Trump e sua equipe tentam reverter. O presidente inclusive tem sugerido estar acima da lei em publicações nas redes sociais.

“Aquele que salva seu país não viola nenhuma lei”, escreveu o republicano no X no último final de semana, parafraseando uma fala atribuída a Napoleão Bonaparte. A mensagem foi republicada pelo perfil da Casa Branca, que, nesta quarta, também compartilhou imagem aparentemente gerada por inteligência artificial em que Trump aparece usando uma coroa. “Vida longa ao rei”, diz a legenda da publicação.

Um dos decretos mais controversos do republicano até agora foi assinado no primeiro dia de governo para acabar com o direito à cidadania de americanos filhos de imigrantes. A limitação nesse sentido é vetada pela Constituição.

Cinco juízes já bloquearam este decreto de Trump por tempo indefinido apontando a inconstitucionalidade. “Tornou-se cada vez mais claro que, para o nosso presidente, o Estado de Direito não passa de um obstáculo para seus objetivos. Para ele, o Estado de Direito é algo a ser contornado ou simplesmente ignorado”, disse o magistrado John Coughenour, de Seattle, ao emitir sua decisão.

Na semana passada, um juiz determinou que o governo desbloqueasse os gastos com ajuda externa, que foram pausados por Trump por 90 dias ainda na primeira semana de governo. A Justiça também chegou a suspender o plano de demissão voluntária proposto pelo presidente a servidores federais, mas depois liberou sua execução.

Em outra frente, a ofensiva de Trump para colocar em licença todos os 2.000 funcionários da Usaid, agência de apoio internacional que está sob forte ataque do governo federal, está pausada até pelo menos a próxima sexta-feira (21).

O republicano determinou pelo X o fechamento da agência, que ele acusa de uma série de desvios de dinheiro e fraudes, sem apresentar provas. O órgão, independente, tem um orçamento de US$ 42,8 bilhões (quase R$ 247 bilhões) destinados a ajuda humanitária e assistência ao desenvolvimento em todo o mundo.

A empreitada de Trump contra a Usaid se fia no bilionário Elon Musk, que controla o Doge (sigla em inglês para Departamento de Eficiência Governamental), embora não seja propriamente um funcionário federal -a Casa Branca fez uma manobra no discurso para dizer que o bilionário não tem autoridade para tomar decisões no governo. Musk afirma que a agência tem gastos excessivos e já a chamou de criminosa.

Na semana passada, o chefe do Doge foi além e defendeu o fechamento de 12 agências inteiras. A atuação do homem mais rico do mundo é também alvo de questionamentos judiciais. Musk tem buscado acesso a lista de pagamentos confidenciais do governo -outra ação que acabou bloqueada por um juiz.

Em outra frente, o Departamento de Justiça fez um levantamento de procuradores que atuaram na acusação contra Trump pela participação no 6 de Janeiro, quando seus apoiadores invadiram e depredaram o Capitólio. O republicano os demitiu ainda na primeira quinzena de governo. O órgão também levantou os agentes do FBI que atuaram no caso. O presidente afirmou que alguns deles serão exonerados.

Na semana passada, o governo recorreu à Suprema Corte para demitir o chefe do Escritório do Conselheiro Especial (OSC, na sigla em inglês), agência americana independente dedicada a proteger funcionários federais que delatam irregularidades no governo.

Hampton Dellinger, que comanda o órgão, havia sido demitido em 7 de fevereiro. Dellinger foi à Justiça, porém, e conseguiu reverter sua exoneração. Agora, Trump foi à mais alta instância possível para tentar concluir sua demissão.

David Super, professor de direito constitucional da Universidade Georgetown, avalia que Trump tem adotado “ações dramáticas em desacordo com a lei”. “Ele está tentando expandir radicalmente os poderes da Presidência. Muitos de seus decretos contêm elementos que são claramente contrários à lei, para permitir que ele argumente pela eliminação dessas leis”, afirma.

Para o professor, a ação mais problemática do presidente é a de dar poderes a Musk para acessar dados governamentais que são altamente sensíveis e com as informações de milhões de americanos. “Os muitos congelamentos de financiamento que ele impôs, alguns por decreto e outros sem diretivas formais, também têm sido profundamente controversos”, diz Super.

O professor afirma ainda que vários desses debates chegarão também à Suprema Corte, onde há hoje uma maioria de juízes conservadores formada pelo próprio Trump. “Algumas de suas ações têm algum suporte legal arguível, mesmo que possam ser políticas ignorantes e míopes; a Suprema Corte pode sustentar algumas delas. Mas não acredito que o tribunal sustentará suas violações diretas da lei federal, como os congelamentos de gastos.”

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