Milei se livra de investigação sobre criptogate no Senado

MAYARA PAIXÃO
BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS)

O governo de Javier Milei escapou de um revés nesta quinta-feira (20) ao conseguir barrar no Senado da Argentina a criação de uma comissão para investigar a responsabilidade do presidente e de seu núcleo duro no caso que ficou conhecido como criptogate.

Foram 47 votos favoráveis, um a menos do que o necessário para avançar na proposta, ante 23 contrários. Em uma saída paliativa bem menos incômoda para o Executivo, os senadores aprovaram um pedido para que o governo apresente um relatório sobre o tema.

O grupo seria composto por 17 senadores e contaria com seis meses para investigar, analisar e esclarecer a conduta de Milei no escândalo que envolve a criptomoeda $Libra, que levou a acusações judiciais e políticas de crime de fraude contra o ultraliberal.

A comissão poderia pedir documentos aos envolvidos e a organismos públicos, convocar testemunhas e também exigir a apresentação de informações pelos órgãos de Inteligência. Ao fim, faria um informe que poderia, eventualmente, levar a uma denúncia na Justiça.

Os senadores também negaram a proposta de convocar membros do Executivo para depor, em especial Milei e sua irmã, Karina, que também é secretária-geral da Presidência.

O próprio governo de Milei anunciou uma espécie de autoinvestigação, com a criação de um Escritório Anticorrupção no Executivo. Foi uma alternativa amplamente criticada pela oposição, que diz que a cúpula do poder não tem independência para se investigar e que não há transparência em uma proposta como essa.

A maior crise da gestão libertária foi aberta há uma semana, quando no dia 14 o presidente divulgou em seu perfil oficial no X a $Libra, uma memecoin -ativo financeiro digital baseado em tendências, ou memes, da internet.

Após a promoção do presidente, o preço do ativo digital subiu e, repentinamente, colapsou, levando milhares a perderem dinheiro. Isso levou a acusações de que houve a fraude comum no mundo cripto e conhecida como “rug pull” (ou “puxada de tapete”), operada pelos próprios criadores da criptomoeda, com quem, aliás, Milei havia se reunido na Casa Rosada no ano passado e divulgado fotos.

Um desses criadores afirmou em mensagens a potenciais investidores que controlava o governo de Javier Milei por meio de pagamentos que operava para Karina, a irmã do presidente e pessoa mais influente na gestão. As comunicações foram obtidas pelo jornal local La Nacion.

Milei apagou a publicação horas depois, quando ficou clara a possibilidade de fraude. Disse não ter todos os detalhes e que apenas divulgou a $Libra, sem promovê-la. Três dias depois, compartilhou uma polêmica entrevista com uma TV local que repercutiu não por seu conteúdo exibido, mas pelo que foi retirado. A pedido do assessor de Milei, Santiago Caputo, um trecho da conversa foi cortado.

Milei está nesta quinta-feira nos Estados Unidos, em mais uma de suas viagens a seu destino preferencial no exterior. Ele espera falar com empresários e avançar nas tratativas para um novo acordo bilionário com o FMI (Fundo Monetário Internacional).

Também nesta quinta, uma nova pesquisa de opinião centrada neste tema mostrou uma comedida desidratação da imagem presidencial.

A pesquisa da consultoria CB realizada online com 1.125 argentinos de mais de 16 anos mostra que, entre os que estão informados sobre o criptogate (84% do total), 49% dizem que promover a $Libra foi uma ação deliberada de Milei, não um erro involuntário, como ele justifica. E 77% dizem que a Justiça deveria investigar a fundo a relação entre Milei e os criadores da $Libra. Além disso, 72,8% afirmam achar que a confiança no presidente diminuirá.

O fator mais relevante, no entanto, é que o desgaste está mais presente entre aqueles que já não apoiam Milei. Fundador da CB, Cristian Buttié diz à reportagem que somente 10% da base que votou em Milei nas eleições que o elegeram há pouco mais de um ano se viu afetada.

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