Lideranças da direita e do centrão criticam insistência de Bolsonaro em 2026

ANA LUIZA ALBUQUERQUE E MARIANNA HOLANDA
SÃO PAULO, SP, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Lideranças da direita e do centrão manifestam em conversas reservadas resistência ao plano do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de insistir em uma chapa encabeçada por ele para a disputa presidencial de 2026, a despeito de sua inelegibilidade.

A reportagem ouviu relatos de dirigentes partidários e parlamentares que temem que a demora em admitir outra candidatura possa custar a eleição no próximo ano.

A denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República na última semana, que coloca Bolsonaro no centro de uma tentativa de golpe e pode levá-lo a uma condenação criminal ainda em 2025, aumentou o desconforto diante das intenções do ex-presidente.

Líderes do campo, inclusive seus aliados, dizem à reportagem que a insistência de Bolsonaro, que tenta preservar seu capital político em um momento crítico, pode prejudicar a ele próprio. A avaliação é de que um indulto só seria possível com a eleição de um nome alinhado ao bolsonarismo.

Eles defendem que o ideal seria aglutinar a direita em torno de um único candidato até o fim deste ano, a tempo de construir uma candidatura nacional.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), é o principal nome levantado por essas lideranças. Como mostrou a reportagem, ele avisou a aliados que aceitaria disputar a Presidência caso Bolsonaro pedisse, mas disse que prefere buscar a reeleição. Em público, afirma que não será candidato.

Outro nome que ganha tração é o de Ratinho Jr (PSD), governador do Paraná. Além destes, há ainda Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais.

Segundo relatos, alguns aliados conversaram com Bolsonaro sobre a importância de sinalizar já um sucessor, mas ele se mostra irritado e reativo a essa possibilidade, com acusações de traição.

Seu entorno familiar reage da mesma forma. Há uma pressão no bolsonarismo para que não se admita outra candidatura em 2026 –qualquer aliado que sugira outros nomes ou fale sobre o tema publicamente vira alvo nas redes sociais.

Uma pessoa do entorno de Bolsonaro compara a situação à de Lula (PT) em 2018, quando estava preso e insistiu na candidatura até ser barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Fernando Haddad (PT) só foi oficializado em setembro, inviabilizando a campanha nacional e levando o partido à derrota.

Essa pessoa diz, portanto, que a direita não pode repetir o mesmo erro. Para ela, hoje o cenário diante da queda na aprovação de Lula é favorável ao grupo, mas uma candidatura só tem chances de prosperar com o apoio de Bolsonaro.

Aliados do ex-presidente dizem que ele está determinado a insistir no próprio nome como cabeça de chapa até o momento do registro, poucos meses antes do pleito, apostando na pressão de movimentos de rua e de aliados internacionais, como o presidente dos EUA, Donald Trump.

Nesse caso, ele prefere que a vice fique com uma pessoa da família, provavelmente o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), que assumiria a candidatura após uma provável impugnação.

Em entrevista à CNN, Bolsonaro também chegou a mencionar sua mulher, Michelle Bolsonaro (PL), como uma possibilidade -contanto que fosse nomeado ministro da Casa Civil. Ninguém do seu entorno, porém, considera essa opção factível.

Bolsonaro mostra resistência à ascensão de outras figuras do campo. Publicamente, ele já criticou Caiado e sugeriu que Zema não tem alcance nacional. Ao lado de Tarcísio, seu pupilo, reforçou que o candidato em 2026 é ele próprio.

Algumas lideranças, porém, tentam derrubar a hegemonia de Bolsonaro. O maior exemplo foi no ano passado, nas eleições municipais em São Paulo, quando o influenciador Pablo Marçal (PRTB) avançou sobre eleitores do ex-presidente mesmo em meio à artilharia da família Bolsonaro contra ele.

Mais recentemente, Bolsonaro também foi desafiado quando descartou a defesa do impeachment no ato organizado para março contra Lula. Ele definiu o mote do protesto como “Fora Lula 2026, anistia já”, apostando que a popularidade do petista possa derreter ainda mais até as eleições.

Como mostrou o Painel, deputados de direita se descolaram dessa estratégia e continuaram a defender o impeachment. Um deles foi Nikolas Ferreira (PL), um dos nomes mais populares do bolsonarismo.

O cientista político Jorge Chaloub, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), avalia que a investigação da trama golpista fragiliza Bolsonaro e abre espaço para que outras lideranças do campo o desafiem.

Ele afirma, porém, que os dois caminhos que se apresentam para a direita até 2026 são complicados: buscar a vitória eleitoral sem o apoio de Bolsonaro ou viabilizar esse apoio, mas lidar com sua instabilidade.

A primeira opção é difícil, diz o professor, diante do “imponderável”. Ele diz que, para ganhar uma eleição, não é suficiente injetar recursos na campanha -é preciso um candidato popular. Chaloub lembra do apoio que o centrão deu a Geraldo Alckmin (PSB) para sua candidatura à Presidência em 2018, derrotada com 5% dos votos.

“Por mais que o centrão seja forte operando internamente, não me parece fácil achar uma candidatura a ser construída”, afirma.

Por outro lado, “não é simples lidar com alguém tão inconstante e personalista quanto o Bolsonaro”, diz Chaloub. “Os vínculos são baseados na lealdade pessoal, e isso traz instabilidade. Alguém que tenha seu apoio corre o risco de desagradá-lo e ser atacado por ele. Difícil ganhar eleição assim.”

O professor acredita que Bolsonaro deve manter sua pretensa candidatura até a data limite do registro eleitoral, considerando que sua popularidade é sua principal moeda. O ex-presidente poderia, por exemplo, negociar o apoio a outra figura em troca da anistia aos envolvidos no 8 de janeiro.

“Qual o grande trunfo do Bolsonaro? Ele não é um grande articulador, não tem um grande partido. O que ele pode oferecer é a capacidade de eleger figuras que apoia”, diz Chaloub.

“Ele vai esticar até o limite para fazer uma troca no final. Tentar influenciar um futuro governo, trocar por uma anistia, ou mesmo para tentar contar com alguns militares [em busca de um golpe], o que parece que está sempre no horizonte de Bolsonaro.”

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