Goiás lidera ranking de abusos contra internos de Comunidades Terapêuticas

Goiás ocupa a liderança no Brasil em termos de denúncias de violência e abusos em Comunidades Terapêuticas (CTs), de acordo com o levantamento realizado pelo Observatório de Violências das Comunidades Terapêuticas, lançado em março de 2024. O estudo, realizado pelo grupo Saúde Mental & Militância do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), registrou 251 reportagens sobre abusos em CTs durante o ano de 2023, sendo que 76 dessas ocorreram no estado de Goiás, o que coloca o estado como o principal responsável pelos casos de violação de direitos nesse tipo de instituição.

Essas instituições, muitas vezes, falham em oferecer condições adequadas de tratamento e em garantir os direitos dos internos. As denúncias vão desde a ausência de planos terapêuticos adequados, até casos de tortura, trabalho forçado, cárcere privado e, em alguns casos, até homicídios. “A violação dos direitos fundamentais das pessoas internadas nas Comunidades Terapêuticas é sistemática”, afirmou Marco Aurélio da Silva Lima, psicólogo e presidente da Comissão Especial de Psicologia na Saúde do CRP-09, ao Jornal Opção.

Os dados do Observatório indicam que 31,4% das matérias registradas envolvem mortes, o que evidencia a gravidade da situação. Um dos casos mais emblemáticos foi o resgate de cerca de 100 internos em Anápolis, onde os pacientes estavam submetidos a condições desumanas.

“As comunidades terapêuticas que operam sem regulamentação adequada são um risco à saúde mental e física dos pacientes”, alertou Marco. Ele ainda destacou que, além de maus-tratos físicos, as instituições frequentemente impedem o contato dos internos com suas famílias e restringem seus direitos básicos, como o uso de aparelhos celulares e documentos pessoais.

“Esse tipo de isolamento é prejudicial à saúde mental, pois impede que os internos mantenham os vínculos familiares e sociais, fundamentais para sua recuperação”, explicou o psicólogo.

Além disso, muitas dessas instituições são dirigidas por líderes religiosos, o que resulta na imposição de práticas espirituais sem o consentimento dos internos. Marco Aurélio reforça que o Código de Ética da Psicologia preconiza que o profissional deve atuar sem influenciar as escolhas religiosas do paciente. “O psicólogo deve garantir que o tratamento respeite a liberdade religiosa e a autonomia do paciente. Impor uma crença religiosa é uma violação dos direitos humanos”, afirmou o psicólogo Marco.

Ele alertou para o risco das práticas religiosas coercitivas encontradas em algumas CTs. “Não podemos permitir que a religião seja usada como uma ferramenta de controle e coerção, pois isso é um desrespeito ao princípio de autonomia que é fundamental para qualquer tratamento psicológico”.

Conselho Regional de Psicologia de Goiás

O Conselho Regional de Psicologia de Goiás (CRP-09) tem se esforçado para fiscalizar e combater essas práticas abusivas. “Desde 2021, o CRP tem feito um trabalho de fiscalização em várias comunidades terapêuticas no estado, com o fechamento de 27 delas apenas em Anápolis”, continuou Marco.

O Conselho tem se posicionado firmemente contra o funcionamento dessas instituições sem a devida regulamentação, o que resulta em práticas como trabalho forçado e tortura psicológica. “O tratamento deve ser baseado em princípios éticos, com profissionais capacitados, e nunca em abordagens coercitivas que causam sofrimento”, completou.

Em resposta a essa situação, a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO) anunciou, no início de 2024, o encerramento de todos os contratos com comunidades terapêuticas e o redirecionamento dos recursos para a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), um serviço regulamentado e alinhado com as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS).

A SES-GO também tem trabalhado em parceria com o Ministério Público e a Vigilância Sanitária para combater as práticas abusivas. “A SES-GO está reforçando a fiscalização das CTs para garantir que as pessoas recebam um atendimento digno, com qualidade e respeito aos seus direitos”, informou a nota oficial da Secretaria.

O que diz a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás

A Secretaria de Estado da Saúde de Goiás informa que a Gerência de Saúde Mental tem adotado medidas para garantir que o atendimento a pessoas usuárias de álcool e outras drogas ocorra em serviços reconhecidos tanto tecnicamente quanto sanitariamente para garantia de cuidados de qualidade e respeito aos direitos humanos.

De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO), um serviço de saúde deve seguir regulamentações específicas e contar com uma equipe de saúde mínima qualificada. Nesse sentido, as comunidades terapêuticas (CTs) não são consideradas serviços de saúde e, frequentemente, não possuem profissionais da área e operam sem a devida regulamentação.

Dessa forma, a SES-GO encerrou, no início de 2024, todos os contratos com comunidades terapêuticas e redirecionou os recursos para a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), garantindo atendimento dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), com serviços regulamentados. Além disso, a Gerência segue articulada com a Vigilância Sanitária para fortalecer serviços devidamente reconhecidos e impedir a expansão irregular dessas CTs.

Em alinhamento com o Ministério Público, a Gerência de Saúde Mental participa de fiscalizações e atua para coibir práticas abusivas, como trabalho forçado e condições degradantes. Nos casos de denúncias de violação de direitos e maus-tratos em comunidades terapêuticas identificadas pela polícia ou por órgãos de controle, a Gerência apoia as ações para assegurar que os internos recebam atendimento digno e adequado na rede pública de saúde.

A Superintendência de Vigilância Sanitária Ambiental e de Saúde do trabalhador, da Subsecretaria de Vigilância em Saúde da SES-GO, desenvolve um trabalho de fiscalização nas Comunidades Terapêuticas no Estado de Goiás em parceria com instituições como Ministério Público, secretarias municipais de assistência social, Polícia Civil e Militar com objetivo de coibir práticas irregulares nesta categoria de estabelecimento.

A maioria das inspeções ocorrem devido denúncias de más práticas que chegam ao conhecimento do sistema de vigilância sanitária, que durante as ações constata que estes locais atuam de forma clandestina e sequer possuem condições sanitárias adequadas. Por isso a importância de esclarecer a população que ao perceber irregularidades proceda com a formalização da denúncia a vigilância pelo disque denúncia 150.

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