Oleg Khlébnikov diz que poetas não se dividem em soviéticos e russos, mas em bons e ruins

Astier Basílio

De Moscou

Não, não há qualquer parentesco entre o poeta Oleg Khlébnikov e o mestre do futurismo russo.

Em uma entrevista, ao “Literaturnaia Gazeta”, ao ser perguntado a respeito da sombra do famosíssimo sobrenome, respondeu: “Vielimir Khlébnikov é um gênio, mas dificilmente um lírico em estado puro. Comigo é exatamente o contrário. Ele me interessa pela sua criação de palavras, pela imprevisibilidade não apenas da próxima palavra, mas também da sonoridade. Ainda assim, o meu grande homônimo não é o meu poeta favorito. O que nos une, além do sobrenome, é a vocação: a poesia e a matemática”.

Oleg Khlébnikov tem 68 anos e nasceu na cidade de Ijevsk. Estreou na literatura com 17 anos incompletos, no jornal “Komsomolskaia Pravda”. O jovem poeta foi saudado por grandes nomes da poesia soviética daquele período, a exemplo de Andréi Vozniessiênski e Boris Slútzki. “Considero as palavras de Slútzki sobre mim uma bênção no ofício — perdoe-me o tom solene. E, depois dessa publicação, chegaram, sem exagero, sacos de cartas. Mas eu era um sujeito irônico e, graças a Deus, consegui não me deslumbrar”.

A entrevista, da qual traduzimos estes trechos, foi concedida em 2007. Quando lhe foi perguntado se era um poeta soviético ou russo, respondeu: “Parece que não deu tempo de me tornar soviético. E nem me esforcei para isso. No geral, na minha opinião, os poetas não se dividem em soviéticos e russos, mas em bons e ruins. Veja Maiakóvski — ele é só um poeta soviético ou também russo? Quando você lê ‘A Nuvem de Calça’s (poema longo da fase futurista) essa pergunta não ocorre — é poesia. Quando você lê ‘Muito bom!’ (poema longo de louvor ao regime), novamente, não ocorre essa pergunta — porque não é poesia”.

Oleg Khlébnikov ganhou o Novo Prêmio Púchkin (2013), o Prêmio “Parábola” da Fundação A. Vozniessiênski (2019), o Prêmio “Vénec” da União dos Escritores de Moscou, entre outros. Traduzido para o francês e dinamarquês. Nossas traduções de sua poesia são as primeiras em língua portuguesa.

Astier Basílio, jornalista, crítico literário e tradutor, faz doutorado em Moscou. É colaborador do Jornal Opção.

3 poemas do russo Oleg Khlébnikov

1

Selfie

Ao longe os indivíduos

estendem a mão que escorre

o jardim, ante o bar, quando

sobre si mesmos fazem vídeos

nos montes, onde houver velório

enlouquecendo ou se enlutando.

Têm o álibi que comprova

que se encontraram ali,

com a exatidão de milésimos.

Têm o desleixo de quem levasse

a mais exata Boa Nova

somente para si mesmos.

2

Quarenta anos fez do seu verso aposta

sem obter qualquer resposta.

Ou na escolha do seu pão errou

ou é um cego o seu receptor.

Você não escolheu nada, ora essa!

Só berrou rimas no meio da brecha

entre a garagem e a cerca colocada

onde ficam as cabras próximas de um “Lada”.

3

Vou viajando num trem, curta a distância

que a penúltima pessoa seja eu que alcance-a,

porque estou no último vagão posso dizer-lhe

caso alguém esteja com muita pressa — vai,

passa na frente, porque a mim tanto faz,

definitivamente, esta chegada dele.

Cheguei desde que nasci, não levo

o anúncio e nenhuma forma de aviso prévio

sobre não ser esperado e necessário aqui.

— mas quem — retruque — é necessário e a que?

faça uma crítica que eu mereça, me ataque.

Entro na escuridão — tem alguém ali.

Vai me esperar? Deus é quem sabe se.

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