‘Não vou ao paraíso’: as mensagens enviadas por suspeita de envenenar bolo

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SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS)

A mulher presa como suspeita de envenenar e matar quatro pessoas da própria família com arsênio, Deise Moura dos Anjos, enviou, no fim do ano passado, mensagens a familiares que estão sendo usadas como parte das provas nas investigações sobre o caso do bolo envenenado em Torres (RS).

Trechos de mensagens foram divulgados em coletiva de imprensa nesta sexta-feira (10) pela Polícia Civil gaúcha. “Vamos mostrar uma pequena parte das conversas que ela teve com pessoas com quem se relacionava para mostrar como funciona a mente dessa pessoa sobre a vida humana”, afirmou aos jornalistas o delegado Marcos Veloso, responsável pelo caso.

“É bem provável que eu não vá para o paraíso”, escreveu Deise em novembro, segundo os investigadores.

Na mensagem completa enviada por ela a um familiar, que não foi identificado pelas autoridades, ela teria escrito: “Quando eu morrer, cuida do meu filho e reza bastante por mim, pois é bem provável que eu não vá para o paraíso”.

Suspeita teria inventado narrativa para convencer família a não levar apuração da morte do sogro adiante. Além das três familiares mortas em dezembro, Deise teria envenenado, também com arsênio, o sogro, Paulo dos Anjos, 68, morto em setembro de 2024. Na época, ele foi internado após comer bananas e leite em pó levados à casa dele por Deise. A causa da morte dele foi registrada à época como complicações por uma infecção intestinal.

Deise tentou cremar corpo do sogro, ainda segundo os investigadores. “Num primeiro momento, depois da morte do sogro, ela tenta a cremação do corpo. Depois, ela tenta outra narrativa: de que seria por causa das bananas [que estariam infectadas em razão das enchentes no ano passado, em Canoas]”, explicou a delegada Sabrina Deffent, na mesma coletiva de imprensa.

Três dias após a morte do sogro, Deise teria sugerido possíveis causas do suposto incidente. “Acho que não faria nada [para investigar a morte], pois pode ter sido várias coisas, intoxicação alimentar, negligência médica, a banana por estar contaminada pela enchente, ou a hora dele mesmo, sei lá”, escreveu ela à sogra, Zeli dos Anjos, uma das vítimas que sobreviveram ao consumo do bolo envenenado, ainda segundo os investigadores.

Em outra mensagem enviada em dezembro, Deise escreveu que família não precisava “procurar culpados” pela morte de Paulo. “Acho que precisamos rezar mais, aceitar mais, e não procurar culpados onde não tem”, enviou ela à Zeli.

“Não tem volta, polícia, nem perícia que possa nos ajudar a desvendar”, escreveu a nora na mesma mensagem. Para o delegado Marcos Veloso, com a mensagem “ela já pensa e joga seu álibi lá na frente”, para “manipular” seus familiares.

Acho que precisamos rezar mais, aceitar mais, e não procurar culpados onde não tem. São só os momentos que Deus nos reserva, e isso sim não tem volta, nem polícia, nem perícia, que pode nos ajudar a desvendar. Trecho que mensagem enviada por Deise à sogra, Zeli, em dezembro, segundo a Polícia Civil.

O QUE APONTAM AS INVESTIGAÇÕES

“Impossível este caso se tratar de intoxicação alimentar, contaminação natural ou degradação de qualquer substância”, afirmou Marguet Mittmann, diretora do Instituto-Geral de Perícias. “Conclui-se, portanto, que a causa da morte de Paulo também foi, de fato, envenenamento”, disse a perita em coletiva de imprensa nesta sexta-feira (10).

Nós temos provas robustas de que ela matou quatro pessoas, por ora. (…) Fortes indícios mostram que essa mulher não só matou quatro pessoas e tentou matar outras três, como também participou de outras tentativas de homicídio. Delegado de Torres, Marcos Veloso, em coletiva de imprensa
Suspeita “pesquisou, comprou, recebeu e usou veneno” para matar as vítimas, segundo a Polícia Civil.

Segundo informado pelos investigadores na coletiva de imprensa, provas técnicas comprovam que Deise fez quatro compras de veneno em um período de cinco meses, “sendo uma antes da morte do sogro e as outras antes do envenenamento das outras familiares”.

A cada prova técnica que nós encontrávamos nos dados do celular da acusada era uma surpresa para todos nós. A gente não tem dúvidas de que se tratava de uma pessoa que praticava homicídios e tentativas de homicídios em série, e que durante muito tempo não foi descoberta e tentou apagar provas que pudessem levar a atribuição de culpa à ela. Delegada regional Sabrina Deffent, em coletiva de imprensa nesta sexta

Procurada nesta sexta, defesa de Deise ainda não se manifestou sobre acusações mais recentes. No início da semana, os advogados Manuela Almeida, Vinícius Boniatti e Gabriela Souza divulgaram em nota que prestaram “atendimento em parlatório” à suspeita e que não tiveram “acesso integral à investigação em andamento, razão pela qual [a defesa] se manifestará em momento oportuno”. O texto será atualizado no caso de futuras manifestações.

‘MANIPULADORA E FRIA’, SUSPEITA MATOU POR ‘MOTIVO FÚTIL’

Suspeita teve “postura fria, com respostas sempre na ponta da língua”, em conversas com investigadores.

Ainda segundo o delegado do caso, Deise tem demonstrado estar “muito tranquila” e, por vezes, “esboça sorrisos”, nos depoimentos que prestou enquanto investigada.

Motivação do crime é “motivo fútil”, seguem investigadores. “Ainda que seja por interesse patrimonial, o preço de quatro vidas não pagaria o que ela queria”, continuou Veloso na coletiva.

“Ela [suspeita] pesquisou veneno, receita de veneno que fosse inodora, sem cheiro, sem gosto. E, com base nas pesquisas, chegou a uma composição química, que ela tentou montar. Percebemos isso através das compras nos sites. E, com essa combinação, ela começa a tentar envenenar familiares, chegando na morte do sogro”, disse a delegada Sabrina Deffente.

“Extremamente manipuladora”, diz delegada sobre suspeita. Segundo mensagens obtidas pela polícia,

Deise convenceu familiares a não procurarem a fundo o motivo para a morte do sogro. “Há sérios indícios de que ela tenha feito outros envenenamentos, que serão apurados também”, afirmou a delegada regional.

Suspeita é que Deise tenha envenenado, com arsênio, farinha usada em bolo. Grandes concentrações da substância foram encontradas no doce e no sangue das vítimas e dos familiares hospitalizados após o consumo, segundo as investigações. Ela foi presa temporariamente e deve ter a prisão mantida após a conclusão do inquérito, segundo os investigadores.

Antes do envenenamento, Deise teria pesquisado “arsênio e similares” na internet. Segundo um relatório preliminar das investigações, as buscas foram descobertas após extração dos dados do celular da suspeita.

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