Pantanal teve 17% da área total queimada em 2024, apontam dados de satélite

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EVERTON LOPES BATISTA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

O pantanal teve 2,6 milhões de hectares queimados em 2024, cerca de 17% da área total do bioma, que é estimada em aproximadamente 15 milhões de hectares. Os dados são do Lasa (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais), da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

O número é quase três vezes maior do que o registrado em 2023 (cerca de 0,9 milhões de hectares).

Na série histórica do centro de pesquisa, que começa em 2012, o ano de 2024 foi o segundo em tamanho de área atingida por incêndios. Ele só perde para 2020, quando uma tragédia recorde foi registrada, sob a gestão Bolsonaro (PL).

Em 2020, mais de 3,6 milhões de hectares do bioma tiveram queimadas -cerca de 24% da área total do pantanal brasileiro, segundo os dados do Lasa.

Um estudo publicado em 2023 liderado por pesquisadores do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) chegou ao número de cerca de 4,5 milhões de hectares queimados em 2020 (aproximadamente 30% da área total do bioma).

Na série de registros do Lasa, o ano de 2014 aparece como o que teve a menor área afetada pelo fogo: 209,9 mil hectares (cerca de 1,4% do total do bioma).

De acordo com dados da plataforma Monitor do Fogo, do MapBiomas, rede colaborativa coordenada pelo Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), a área atingida por queimadas no Brasil todo chegou a cerca de 30,9 milhões de hectares em 2024 -um crescimento de 79% em relação ao ano anterior. O número é o maior da série histórica do projeto, iniciada em 2019.

O recorde de fogo no país contrasta com as promessas do governo Lula (PT) para a área ambiental. A gestão, que tem Marina Silva à frente do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, assumiu com o compromisso de reverter os danos ambientais do período sob Bolsonaro.

O país enfrentou em 2024 a maior seca em 70 anos. Sobre o quadro do pantanal, maior planície alagável do mundo, Marina disse, em setembro, que, se mantidas as condições atuais no clima, esse santuário de biodiversidade pode desaparecer até o fim do século, citando previsões de cientistas.

“Isso tem um nome: baixa precipitação, alto processo de evapotranspiração, não conseguindo alcançar a cota de cheia, nem dos rios nem da planície alagada. E, portanto, a cada ano se vai perdendo cobertura vegetal. Seja em função de desmatamento ou de queimadas. Você prejudica toda a bacia e assim, segundo eles [cientistas], até o final do século nós poderemos perder a maior planície alagada do planeta”, afirmou a ministra, na Comissão de Meio Ambiente do Senado.

Para 2025, o governo federal prevê um possível novo quadro de seca no pantanal, segundo reunião realizada nesta sexta-feira (24) em Brasília.

Dados do MapBiomas para o pantanal apontam 1,9 milhões de hectares queimados no ano passado, 700 mil hectares a menos do que o registrado pelo Lasa. Os dois trabalhos usam metodologias distintas.

O Lasa faz o levantamento a partir de imagens de satélite e, no processamento dos dados, inclui o uso de um algoritmo que classifica as regiões onde um incêndio é identificado e, então, um alerta é emitido na página do laboratório na internet. O tempo entre a obtenção da imagem e o alerta é de algumas horas.

Uma nota técnica publicada pelo Lasa em outubro de 2024 indicou que o regime de seca e as altas temperaturas fizeram crescer a quantidade de material combustível na região.

Segundo o documento, naquele mês, o acumulado do indicador que estima a probabilidade de ocorrência de incêndios (o chamado índice meteorológico de perigo de fogo) era o maior desde 1980.

Mas as condições naturais favoráveis para o fogo são apenas uma parte da história. A maioria das queimadas são causadas por ação humana, diz Júlia Rodrigues, pesquisadora do Lasa.

“Trata-se de uma complexa combinação de fatores [para haver fogo] que envolve a seca e a atividade humana. Podemos ter um clima propenso aos incêndios, mas, sem a ignição, a vegetação não vai queimar”, afirma a cientista.

Segundo o sistema BD Queimadas, do Inpe, dedicado ao monitoramento dos focos de fogo, em 2024 foram registrados 14.498 no pantanal, o pior número desde 2020 (22.116 focos).

“O fogo faz parte do território, mas registros de incêndios graves em tão curto espaço de tempo pode significar um impacto grande para a capacidade de regeneração do pantanal. Bancos de sementes vão se perdendo, milhões de animais tendem a morrer e os incêndios sucessivos não permitem tempo de recuperação”, afirma Yanna Fernanda, secretária-executiva da ONG IHP (Instituto Homem Pantaneiro).

“O fogo é uma ferramenta de trabalho no pantanal, mas precisa ser usado com técnica”, completa ela, sobre o emprego da queima na produção agrícola.

Com sede em Corumbá (MS), a 426 km de Campo Grande, o instituto é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos que atua na preservação do pantanal e da cultura local fazendo gestão de áreas protegidas e pesquisa.

Fernanda ressalta que o ser humano continua sendo o principal causador do fogo no bioma. “Existem as causas naturais, hoje identificadas principalmente por raios, mas isso só ocorre no período em que há chuva”, explica.

No caso dos incêndios iniciados por ação humana, Fernanda destaca alguns cenários, como o fogo intencional para limpar uma área de vegetação, que, quando feito em período de seca, pode se tornar um grande incêndio florestal, ou a queima de lixo, que também pode sair do controle em um momento com baixa umidade, estiagem e ventos mais fortes.

Desde os graves incêndios de 2020, ações de prevenção contra o fogo foram intensificadas na região, conta Fernanda. Ela destaca a maior presença de brigadas de combate às queimadas, ações de educação ambiental e um sistema de inteligência artificial que funciona no IHP, capaz de monitorar o risco de fogo em uma área de 1 milhão de hectares.

Fernanda aponta que o ano de 2025 deve ser desafiador para o bioma. “Apesar de estarmos no período chuvoso, a estiagem persiste no pantanal, mantendo a região em estado de alerta”, afirma.

“O nível do rio Paraguai vem subindo, como demonstram os dados da Marinha do Brasil e ANA [Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico], o que pode oferecer algum alívio, mas não elimina a necessidade de monitoramento constante. No contexto das mudanças climáticas, enfrentamos extremos cada vez mais severos, exigindo esforços diários e coordenados para prevenir incêndios”, conclui.

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