Rodrigo Bocardi, ex-Globo, é mesmo o “monstro” que estão pintando?

De acordo com o relato de um jornalista, o político baiano Antônio Carlos Magalhães (1927-2007) — conhecido na terra de Jorge Amado como Toninho Malvadeza e ACM — disse que há três tipos de jornalistas.

O primeiro gosta de mordomias. Então, os governantes e empresários providenciam hotéis, restaurantes e passagens de avião. Tudo de graça. Quanto voltam para suas redações, estão “conquistados”.

O segundo aprecia favores. Por isso os governantes e empresários arranjam rapidamente empregos para seus familiares. A farra dos cargos não é “esquecida” quando o jornalista se senta à mesa para escrever ou então quando empunha o microfone para falar sobre os possíveis “acertos” ou “malfeitos” dos “amigos”.

O terceiro é aquele jornalista que só aprecia notícia e não é subornável. ACM dizia que este é o mais “perigoso”.

Antônio Carlos Magalhães foi governador da Bahia e senador | Foto: Senado

Bocardi é “exceção”? Oxalá não seja a regra

No momento assiste-se à “crucificação”, em praça pública, do jornalista Rodrigo Bocardi.

O ex-apresentador do “Bom Dia São Paulo” foi demitido porque estaria usando sua influência na TV Globo para beneficiar clientes comerciais. Portanto, a si próprio.

Depois de sua demissão, feita em nome de “princípios éticos”, vários sites esbaldam-se na publicação das supostas “falcatruas” cometidas por Rodrigo Bocardi. Há evidente exagero e, no mais das vezes, não há a exposição do contraditório. Por mais “culpado” que seja, o jornalista tem o direito de se explicar. Dirão: ele não quer falar. Então, publiquem isto nas “reportagens”.

Rodrigo Bocardi trabalhou um quarto de século na Globo, ou seja, 25 anos. Não é pouca coisa. É uma vida. Toda uma geração. Os melhores anos de sua vida foram dedicados à empresa da família de Roberto Marinho.

Mino Carta diz que a Abril deu sua cabeça à ditadura e ganhou um empréstimo vultoso | Foto: Reprodução

Por que, depois de 25 anos, a Globo só descobriu agora que seu ex-funcionário — colocado no posto mais cobiçado e bem pago, o de apresentador de telejornal — estava envolvido em supostas “falcatruas” (“assessorias” e uso de informações privilegiadas, por exemplo)?

A questão não tem sido levantada pelos principais críticos de Rodrigo Bocardi. Por quê? Porque teriam de criticar a Globo, notadamente sua ineficiência na fiscalização dos atos de seus jornalistas? Não se sabe.

O russo Vladimir Lênin — e não Bertolt Brecht, como se costuma citar — teria dito: o que é assaltar um banco perto de um banco.

Não se está sugerindo que a Globo comete irregularidades para ampliar seu faturamento. Mas a história da imprensa, e não só no Brasil, não é a de bons samaritanos (e não se está falando apenas de escroques do nível de Assis Chateaubriand, “o rei do Brasil”).

O suposto faturamento de Rodrigo Bocardi é “pinto de granja” perto do que determinados jornais e emissoras de televisão faturaram e faturam com determinados esquemas poucos católicos e evangélicos.

Getúlio Vargas e Samuel Wainer (bancado pelo Banco do Brasil): aliados | Foto: Reprodução

Porém, em defesa de uma pureza que não existe — é pura ficção —, vários jornalistas estocam pedras para jogá-las (exclusivamente) em Rodrigo Bocardi. Apontado como “chato” e “arrogante”, não tem defensores, ao menos em termos públicos.

A construção de homens perfeitos é uma impossibilidade (as ditaduras de direita e de esquerda que se “especializaram” nisto criaram sociedades e indivíduos imperfeitos). Mas é “preciso” pisar na cabeça dos que caem para aliviar a própria consciência daquilo que se faz e se esconde. E não se está falando tão-somente de jornalistas que assessoram políticos e empresários, direta ou indiretamente, e às vezes são bem-vistos e, até, ganham prêmios de melhores do ano.

Não se está defendendo o indefensável Rodrigo Bocardi e seus atos. O que se está sugerindo é que se precisa ir além do jornalista.

É preciso discutir como se faz jornalismo num país como o Brasil, de capitalismo retardatário, com salários altos ou baixos, e no qual muitos que posam de santos não o são. A começar de alguns empreendimentos editoriais e de riquezas acumuladas às custas de empréstimos em bancos públicos, com juros de avô para neto.

Criador da “Veja” e da “CartaCapital”, Mino Carta costuma citar o caso da Editora Abril e um bem-vindo empréstimo de 50 milhões de dólares intermediado pela Caixa Econômica Federal nos tempos da ditadura civil-militar. Mas certamente há outros, como o do jornal “Última Hora”, de Samuel Wainer, altamente favorecido, na década de 1950, pela supersafra de dinheiro do Banco do Brasil.

Por fim, resta a pergunta: e se Rodrigo Bocardi não for um caso isolado? Oxalá não seja a regra.

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