Brasil propõe que COP30 crie ‘mutirão global’ contra as mudanças climáticas

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GIULIANA MIRANDA
MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS)

O Brasil quer que a COP30, a 30ª conferência do clima das Nações Unidas, desencadeie um “mutirão global” contra as mudanças climáticas. A cúpula, com mais de 190 países, acontecerá de 10 a 21 de novembro em Belém, no Pará.

A proposta está em uma carta divulgada nesta segunda-feira (10), na qual o presidente da conferência, o embaixador André Aranha Corrêa do Lago, apresenta sua visão para a cúpula.

Relembrando as origens indígenas do termo, derivado da expressão em tupi-guarani “motirõ”, que se refere “a uma comunidade que se reúne para trabalhar em uma tarefa compartilhada, seja colhendo, construindo ou apoiando uns aos outros”, o diplomata brasileiro convocou o mundo à ação.

“Ao compartilhar essa inestimável sabedoria ancestral e tecnologia social, a presidência da COP30 convida a comunidade internacional a se juntar ao Brasil em um mutirão global contra a mudança do clima, um esforço global de cooperação entre os povos para o progresso da humanidade”, diz o texto.

Em entrevista antes da divulgação do documento, o embaixador Corrêa do Lago defendeu a proposta.

“A urgência climática nos obriga a essa ideia do mutirão que estamos lançando”, afirmou. “Todo mundo tem que se juntar para um bem comum. Não são apenas os países, nós temos que juntar a sociedade, o setor privado, a juventude. Nós temos de juntar todos em torno de um movimento que nos parece tão urgente.”

A carta descreve ações para “canalizar a sabedoria coletiva”. Uma das medidas é a criação de um “círculo de presidências”, para o qual serão convidadas as lideranças da COP21 à COP29, a fim de aconselhar o processo político da conferência.

Além disso, haverá um convite para as atuais presidências das outras conferências das partes das Nações Unidas —a COP da biodiversidade e a COP de combate à desertificação para contribuir com reflexões sobre a agenda em andamento e o futuro da governança climática global.

Corrêa do Lago também afirmou que haverá espaço para as populações tradicionais. Povos indígenas serão convidados a formar um “círculo de liderança”, com o objetivo de ampliar essa representação e garantir que “os conhecimentos e a sabedoria tradicionais sejam integrados à inteligência coletiva global”.

Ainda no âmbito das sinergias, o Brasil pretende trabalhar com a presidência da COP29, realizada no ano passado em Baku, para ampliar o financiamento climático para os países em desenvolvimento, atingindo a meta de pelo menos US$ 1,3 trilhão por ano até 2035.

A carta também destaca a complexidade do atual cenário climático, mencionando que 2024 foi o ano mais quente da história da humanidade e o primeiro a ultrapassar a marca de 1,5°C em relação ao período pré-industrial meta preferencial do Acordo de Paris, firmado em 2015 para frear as mudanças climáticas.

O documento ressalta que a conferência em Belém será “a primeira a ocorrer indiscutivelmente no epicentro da crise climática e a primeira a ser sediada na amazônia, um dos ecossistemas mais vitais do planeta e que, segundo cientistas, agora corre o risco de atingir um ponto de inflexão irreversível”.

Ao longo dos anos, a publicação de cartas pelas lideranças das conferências do clima da ONU tem servido para apresentar à comunidade internacional as ideias e propostas para os encontros.

Em um momento em que vários governos põem em xeque as instituições internacionais incluindo os EUA, que anunciaram a sua retirada do Acordo de Paris, o novo documento reafirma, em vários pontos de suas 12 páginas, o compromisso da presidência da COP30 com o multilateralismo.

Em declaração aos jornalistas, o embaixador listou as três prioridades da presidência para a conferência: acelerar a implementação do Acordo de Paris, garantindo que os compromissos saiam do papel; defender e fortalecer esse pacto e o multilateralismo; e conectar as negociações com a vida real, “traduzindo” a mensagem da COP30 para a população.

Na carta, Corrêa do Lago sugere que os negociadores do clima façam uma autocrítica e respondam, por meio de ações concretas, “à grande percepção externa de que as negociações se arrastam por mais de três décadas com poucos resultados efetivos”.

“Quando nós negociávamos clima 25 anos atrás, estávamos partindo da perspectiva de que os impactos aconteceriam mais tarde e seriam menos intensos do que o que está acontecendo agora”, afirmou a jornalistas. “Com a urgência climática, os negociadores não podem continuar a propor as mesmas soluções de 25 anos atrás.”

A diretora-executiva da COP30, Ana Toni, considera que, ao longo dos anos, o processo de negociações focou excessivamente as promessas, metas e compromissos que, embora fundamentais, não foram suficientes para garantir a aceleração necessária na implementação das medidas climáticas. Ela defendeu a ampliação dos esforços para comunicar melhor as questões concretas ao público.

“Se antes a mudança do clima era algo distante, algo para o futuro, agora ela já invadiu nossas casas, nossas cidades, e é muito concreta. Então, temos de conectar o regime global ao dia a dia das pessoas.”
Os líderes da COP30 afirmaram ainda que pretendem dar transparência à agenda da conferência, sem “pautas de última hora”.

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