Povo mais aéreo do mundo

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Por Gustavo Mariani*

Brasileiros consideram o mineiro Alberto Santos Dumont “pai da aviação”. E antigos historiadores contam que o Brasil foi o primeiro país sul-americano a usar aviões, militarmente. Não foi bem assim – deveria ter sido. Vem comigo, isto é, venha comigo! 

 Seguinte: certa vez, estando em Curitiba, em férias, aproveitei para pesquisar, no Arquivo Público do Paraná, sobre Maria Rosa, uma heroína da Guerra do Contestado. Achei pouca coisa sobre ela, e muito mais da tal guerra, disputa territorial entre Paraná e Santa Catarina, com participação de fanáticos religiosos, tipo Guerra de Canudos (1896/1897), a Bahia – assuntos para futuras colunas.

Tempos depois, novamente em férias, mas no Rio de Janeiro, pintou vontade de pesquisar sobre Contestado e fui levantar poeira nos arquivos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil e no Arquivo Histórico do Exército. O que anotei, porém, foi bem diferente do que havia lido sobre aviação militar em Contestado. Vamos para o parágrafo abaixo.

Ouvia-se falar que os italianos haviam ido à Guerra Ítalo-Turca (1911/1912) usando aviões e sobrevoado linhas turcas, na primeira missão de reconhecimento aéreo do mundo ((23.10.1911), e dias depois (01.11.1911), lançado a primeira bomba aérea sobre as tropas turcas (em território da Líbia). O Exército brasileiro gostou do que ficara sabendo sobre os tais aviões (ainda com motores fracos e construídos com madeira, bambu, lona e fios de arame) e, como o país enfrentava a Guerra do Contestado,  o general Fernando Setembrino de Carvalho, chefe do gabinete do ministro da Guerra, requisitou cinco aparelhos junto ao Aeroclube Brasileiro (criado em 14.10.1911) para dar um alô na situação.

Aparelhos requisitados, o tenente Ricardo João Kirk e o italiano Ernesto Darioli  montaram e os embarcaram, por via férrea, para a área do conflito. Durante a viagem, fagulhas saídas da locomotiva transportadora atingiram um galão de gasolina e o fogo alastrado deixou apenas três aeronaves em condições operacionais. Pior: os militares desconheciam relevo e clima na região conflitada, o que só permitia a um aviador se guiar pelo curso dos rios e da estrada de ferro.

Pois bem – isto é, mal!  Era o 1º de março de 1915, quando o tenente Kirk, pilotando um modelo Morane Saulnier Parasol L, colidiu com um pinheiro, durante espionagem a redutos dos sertanejos conflitantes, quando tentava provar ao governo brasileiro as vantagens do emprego de aviões no campo militar. No entanto, como não sobrevivera ao acidente, por ali encerrou-se a intenção brasileira de usar aviões militarmente em conflitos – está nos arquivos consultados.

Com aquilo, o primeiro uso militar do espaço aéreo pelos brasileiros ficou sendo mesmo durante a Guerra da Tríplice Aliança (Brasil/Argentina/Uruguai), contra o Paraguai (1864/1870), usando  balões de tecido de algodão, revestidos por verniz para proteger a tela e diminuir o escape de gás (junho a setembro de 1867), com os “brazucas” – aí, sim –  sendo os primeiros sul-americanos a fazê-lo.

 O Brasil, porém, pode se gabar em assuntos de aeroespacialidades. Dizem que os primeiros balões de ar quente foram construídos pelos chineses, entre 220 e 280. Só que o primeiro voo documentado de um deles foi realizado pelo brasileiro Bartolomeu de Gusmão (08.08.1709), na portuguesa Lisboa, diante do de Dom João V, rei de Portugal – como se vê, o Brasil é um país e gente bem aérea.    

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