Centro Histórico de Salvador merece avanços na ocupação residencial

Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1984 e declarado Patrimônio Mundial pela Unesco em 1985, o Centro Histórico de Salvador abriga um dos maiores conjuntos arquitetônicos preservados da América Latina. Em meio a monumentos, igrejas barrocas e casarões históricos – onde grandes figuras como Gregório de Matos, Jorge Amado, Ruy Barbosa, Octávio Mangabeira e muitos outros residiam –, todo o Centro Histórico é um marco fundamental na preservação da rica história de Salvador, que hoje completa 476 anos.”O nosso Centro Histórico atraiu rainhas, reis, presidentes, músicos… É um palco da humanidade e um shopping a céu aberto, onde acontece de tudo e você encontra de tudo, mas também é uma terra de aventureiro. Têm pessoas que chegam no Pelourinho sem nada, e em um ou dois anos está trabalhando e transformando a vida. E não só gente daqui. Estrangeiros vem para a Bahia, se instalam no Pelourinho e aprendem a dançar, pintar, jogar capoeira e criam família. Vemos muitos casos assim aqui. O Centro Histórico é fantástico e mágico”, afirma o artista plástico baiano Menelaw Sete.

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Há 30 anos no Pelourinho com seu ateliê, Menelaw aponta que a segurança do Centro Histórico deve sempre estar em pauta, assim como a sua conservação, já que ele reúne dentro de si inúmeros patrimônios históricos. Ele também explica que o Centro Histórico é o berço de grandes artistas – das mais diversas artes -, e uma região que desenvolve muitos trabalhos sociais através de entidades como o Olodum e os Filhos de Gandhy. “Eu, por exemplo, trabalho com o pessoal do Ação Cidadania há mais de 20 anos e trouxemos muitas ações para o Centro Histórico. Há também a Banda Didá, que possui um lado social muito forte e toda semana distribui alimentos. Tem de tudo no Centro Histórico e por isso ele é impressionante”, salienta o artista plástico.Impressionante, mas nem sempre creditado com tal. Por isso, o tombamento do Centro Histórico, afirma a trancista, turbancista, atriz e liderança religiosa, Negra Jhô, “é uma questão, também, de consciência cultural”. O Pelourinho, marcado como um lugar de dor para os povos escravizados, foi se resignificando com o passar dos séculos. “Esse lugar já teve muita tristeza e agora nós estamos aqui, como líderes e descendentes de reis e rainhas africanas sacrificados, colocando os nossos corações para pulsar com música, dança, culinária e cultura. O Pelourinho é puro amor e coração. É o coração de Salvador”, afirma Negra Jhô.A realidade é que é o ser humano que faz o Centro Histórico ser o que ele é, aponta a trancista. “O Pelourinho faz parte de mim, assim como minha casa, onde amanheço agradecendo as paredes e beijando meu chão, pois sei que esse lugar precisa de amor. Para viver esses arquitetônicos tem que ter amor, calor humano, fogo aceso e água na torneira. Isso não só fortalece o nosso turismo, mas nos fortalece. O Pelourinho precisa ser mais visitado pelo soteropolitano, assim como mais famílias precisam ocupar essas casas. É a vida e alegria das pessoas que deixam esses prédios em pé”, explica Negra Jhô.Presentes de níverFaz cerca de 40 anos que Negra Jhô mora no Centro Histórico, quase o mesmo tempo que a sambista Gal do Beco canta e frequenta a região. “E depois de tanto cantar por essas ruas, há 13 anos me tornei moradora. O Pelourinho é um celeiro de artistas, de cultura e de samba. Muitas vezes sento na frente de minha casa aqui na Ladeira do Carmo e tenho a melhor vista do mundo: o Pelourinho em festa e com um samba em cada esquina. Para mim o Centro Histórico é o melhor lugar do mundo para viver. É o meu lugar, mesmo com seus problemas e controvérsias”, afirma a sambista.Problemas e controvérsias esses que são acompanhados de perto por seus moradores, afirma o escritor, poeta e agitador cultural Clarindo Silva, proprietário do restaurante Cantina da Lua. Para ele, o tombamento do Centro Histórico continua sendo um grito de alerta para toda a humanidade. “Mas ainda hoje é preciso encontrar formas de fazer com que as pessoas assimilem a importância e grandiosidade desse lugar. Acredito que a cidade merecia como presente mais avanços na ocupação residencial e na revitalização de prédios e ruas históricas que levam ao Centro Histórico”, explica.A Rua Chile é um grande exemplo disso: pulsante conglomerado comercial de Salvador até a década de 1970, para a decadência nas décadas seguintes e então, agora, ela volta aos holofotes com a restauração do Palacete Tira Chapéu e a chegada de hotéis. “Isso é o resultado dos esforços tanto da Prefeitura quanto do Governo do Estado, que não só ajudam na atração dos setores privados, mas também revitalizam e ocupam o Pelourinho com museus, casas de cultura e outros espaços. E que continue assim. O Centro Histórico precisa ser ocupado, lembrado e visitado”, afirma Clarindo.Historiador, professor e artista plástico, Rafael Dantas lembra que esses processos de revitalização em regiões de arquitetura histórica levam tempo, o que é essencial para preservar o valor histórico do local. Porém, é inegável o poder que uma revitalização tem de atrair outras. “Podemos ver isso na própria Rua Chile, onde devem surgir mais dois ou três empreendimentos nos próximos anos. Na região da Praça Castro Alves e no entorno já existem projetos estruturantes por parte do Governo do Estado que sinalizam uma melhoria urbana muito significativa nos caminhos de entrada e saída do Centro Histórico”, explica.O Estado, afirma o historiador, vem assumindo mais e mais compromissos com a revitalização e manutenção da região. “Boa parte dos imóveis do Centro Histórico são do Governo do Estado, enquanto outra grande parcela são das igrejas, irmandades religiosas, Casa de Misericórdia e etc, mas o Estado segue na liderança nesse sentido, com museus e sede de órgãos estaduais. A Prefeitura, claro, não fica atrás, em especial nos últimos anos na área do Comércio, com empreendimentos como a Cidade da Música, Casa das Histórias e outros casarios destinados à área cultural”, lista o historiador.Para Rafael Dantas, o casamento entre as ações da Prefeitura e do Governo do Estado voltadas ao Centro Histórico de Salvador e seu entorno é algo com o que a população sai apenas ganhando. “Outro ponto é o setor privado, que tem sido essencial nesses últimos anos, em especial com os grandes hotéis na Rua Chile. Essas iniciativas nos mostram que o público e o privado, as instituições e nós, a população, todos juntos, podemos assumir cada vez mais o protagonismo daquele espaço e não depender apenas das altas estações do turismo”, explica.

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